3.04.2011

respostas a perguntas inexistentes (134)

cartas de amor e candidaturas a um emprego

Durante um café, queixava-se hoje um amigo meu, desempregado pela terceira vez em poucos anos, que a maior parte das empresas nem sequer responde às candidaturas enviadas por ele. Tem razão. Pelo menos a minha experiência também confirma isso. Não estou desempregado mas uma vez por outra, e assim como quem não quer a coisa, lá respondo a um anúncio que considere mais adequado.
Uma candidatura a um emprego é uma carta (ou um email, actualmente) onde tentamos mostrar o que sabemos e somos capazes de fazer, e explicamos porque é que o queremos fazer. É relativamente fácil, fazer essa candidatura, e por isso é que de vez em quando a faço mesmo sem andar à procura de emprego.
Lembrei-me, no entanto, da dificuldade que sempre tive em escrever cartas de Amor, aquelas em que nos candidatamos a Amar alguém e tentamos mostrar porque é que o queremos fazer. Acho que escrevi muitas cartas de Amor na minha vida mas não entreguei quase nenhuma. A maior parte delas acabou numa bolinha de papel tão amarrotada quanto a minha alma de jovem adulto apaixonado. E assim, não me candidatando a nada também nunca tinha resposta.
Uma ou outra entreguei, apesar de tudo, ou pelo menos arranjei coragem e maneira de ela chegar à destinatária. Acho que é a fase pior, a fase da "não resposta". O Amor até se pode resolver com um "não", mas dificilmente se resolverá com o desprezo. E eu perdi a conta às "não respostas" que tive. Ou melhor, que não tive.
Expliquei isto ao meu amigo. Não responder a uma carta de Amor é um crime, não responder a uma carta para um emprego é normal. As cartas de Amor que se escrevem levam sempre um bocadinho de nós: um sorriso, uma lágrima ou mesmo um pouco de suor. Quando não têm resposta esse bocadinho fica a faltar-nos, como se fosse a peça de um puzzle incompleto. À candidatura a um emprego falta-lhe isso, essa parte de nós.
No mesmo dia em que declaramos Amor a uma mulher, todas as outras mulheres do mundo se tornam uma sombra ao pé dela. No mesmo dia em que nos candidatamos a um emprego, todos os outros empregos do mundo similares a esse, seriam bem vindos.
A minha chávena de café já estava fria. A dele também. Levantámo-nos e ele lá foi, enviar mais quatro ou cinco cartas a tentar arranjar emprego. Nunca ninguém neste mundo enviou quatro ou cinco cartas de Amor no mesmo dia.

18 comentários:

Rana disse...

Gostei tanto... que me deixaste sem palavras.
Palavras para quê?!!

Helena disse...

Gosto de escrever cartas de Amor...embora pouco receba :)E nessas incluo, a minha irmã, os meus filhos, as minhas amigas, os meus amigos, as minhas colegas...todos aqueles que me fazem bem!

Jibóia Cega disse...

Parabéns Ivar, estas tuas reflexoes estao sempre muito boas.

early bird disse...

os últimos dois parágrafos. apetece-me "escarrapachá-los" no meu blogue !

*.*

CurlyGirl disse...

"No mesmo dia em que declaramos Amor a uma mulher, todas as outras mulheres do mundo se tornam uma sombra ao pé dela."
=)

Ivar C disse...

rana, obrigado. :)

helena, se calhar essa é a melhor definição de carta de amor, uma que nos faça bem. :)

jibóia cega, obrigado. :)

girl in motion, estás à vontade. eu só agradeço. :)

curlygirl, :)

Ana disse...

Adorei! Mas que lindas palavras... Eu ando à procura das duas coisas: emprego e amor. Vou enviar ainda hoje mais algumas candidaturas de emprego. E talvez devesse enviar alguma "candidatura" de amor, mas essa é definitivamente mais difícil...

Briseis disse...

Oh, Bagaco, ouvir-te é sempre um gosto e um privilégio... mas o pobre do moço estava a queixar-se da falta de emprego e tu das-lhe com cartas de amor?!
Pelos vistos, ele foi compreensivo e acabou por ser uma boa conversa, mas se fosse outra pessoa, assim alguém com os nervos mais à flor da pele, arriscavas-te a levar uns sopapos!lol

Fatyly disse...

À candidatura a um emprego falta-lhe isso, essa parte de nós.
................
e deste a ele e a mim uma grande lição de vida numa bela carta de Amor!

A meu ver é o que falta mais nos Centros de Emprego que a meu ver há de tudo, menos amor...e alguns atendem...como se de "gado se tratasse"!

Faço votos que o teu amigo encontre e que tenha ouvido as tuas sábias palavras!

EJSantos disse...

"... e ele lá foi, enviar mais quatro ou cinco cartas a tentar arranjar emprego"

Doeu me o coração. Já passei por isso. Sei o que se sofre.
Volto a passar por isso, não na minha pessoa, mas através da minha mulher, desempregada e a fazer tudo o que pode para voltar ao trabalho.

Ivar C disse...

ana duarte faria, é mais difícil de enviar. nos dias que correm não sei se é mais difícil obter resposta. boa sorte. :)

briseis, dado que não lhe posso arranjar eu emprego. :)

fatyly, tens razão, actualçmente ser desempregado é um estigma, como se os desempregados fossem culpados de alguma coisa. :)

ejsantos, actualmente é difícil arranjar emprego, sim. ainda mais um emprego com um salário e um horário minimamente justo. é preciso ser forte. boa sorte. :)

Eli disse...

A pessoas diferentes não.

Mas valeu o mesmo das que são enviadas a empresas...

(Tanto por/para dizer)

The Little Funny Girl disse...

Adorei, na realidade são coisas completamente diferentes, numa carta de amor estamos a tentar entregar-nos a alguém de corpo e alma, numa candidatura estamos a tentar mostrar a alguém as nossas capacidades, despertam sentimentos diferentes..

Ivar C disse...

eli, :)

someone named bani, exacto. :)

memyselfandi disse...

Eu tenho algumas coisas no meu diário, não sei se chegarão a ser cartas de amor, nunca enviei nada do que lá está escrito. Adoraria um dia receber, contudo =)
Caro amigo, tu "rulas" como ninguém! =)

Ivar C disse...

memyselfandi, já deves ter recebido algumas. já, já... :)

Anónimo disse...

Para não variar, adorei!!

"O Amor até se pode resolver com um "não", mas dificilmente se resolverá com o desprezo. E eu perdi a conta às "não respostas" que tive. Ou melhor, que não tive."

:)

Framboesa (uma diva de galochas) disse...

Quando o meu pai namorava com a minha mãe, meteu-se a guerra no Ultramar pelo meio.Esteve lá 4 anos. A minha mãe escreveu-lhe uma carta todos os dias.Todos.Durante 4anos.E nos aniversários, ainda ía também um postal.
Secalhar é por isso que hoje estão ainda juntos e felizes...a resposta ás cartas mantem-se e renova-se até hoje
:-)