10.30.2015

conversa 2170

Ela - Não te posso telefonar mais este mês. Já gastei os minutos todos que tenho para falar...
Eu - Tens que ir para o meu tarifário. Tenho dois mil minutos por mês...
Ela - É como eu, então.
Eu - Gastaste dois mil minutos em menos de um mês?!
Ela - Sim, mas foi quase tudo com a mesma pessoa...
Eu - Dois mil minutos são mais de trinta horas ao telefone...
Ela - Sim, é pouco...

respostas a perguntas inexistentes (348)

Ela disse-me que era o vento Norte, mas eu não acreditei. Para mim não há vento no mundo que não venha de ti, mesmo que eu não saiba onde estás. É por isso que, em vez de um ponto cardeal, dou a todos os ventos o teu nome, apesar de não o dizer a ninguém.
Dá-me um certo prazer ver o mundo a abrigar-se de ti, ajeitando os colarinhos ou até segurando capuchos fugidios, enquanto  eu abro o casaco e ofereço o meu peito ao frio. É assim que tu me tocas e me abraças nos dias que correm. É também assim que eu te respiro.
E então foi assim: uma criança fugiu à mãe para ir para os baloiços e eu segui-a com os olhos, não fosse ela desaparecer numa curva qualquer da cidade. Quando deu pela falta dela, a  mãe procurou-a através da janela do café, entre as árvores que dançavam ao teu ritmo, e correu atrás dela com um cachecol cor de laranja na mão. Embrulhou-a como se embrulha uma prenda e voltou para dentro. Talvez por se ter apercebido que eu vira a cena toda, justificou-se chamando Norte ao vento. Sorri-lhe, mas não acreditei.
É só para te dizer que não precisas de soprar tão intensamente. Quando o vento amainar hás-de ser outra coisa qualquer.

10.29.2015

respostas a perguntas inexistentes (347)

Acho que sou um bocado desarrumado. Por exemplo, não sei onde guardar as memórias que tenho de ti. Passo os dias a tentar guardá-las numa prateleira qualquer da vida, mas não consigo. Acabo sempre com elas espalhadas por todo o lado, de tal forma que quero andar e não consigo sem as pisar.
Ontem, por exemplo, fiz um montinho com elas e coloquei-o numa caixa que fechei. Pensei que era desta, mas não. A meio da noite precisei duma memória de quando me sorriste ao aterrarmos na cidade dos anjos. Para a encontrar tive que desarrumar as memórias todas e já não fui capaz de as meter no mesmo sítio.
Tem-me acontecido mais ou menos o mesmo todas as noites. O Amor é uma questão de arrumação e eu sou um desarrumado por natureza, o que quer dizer que a minha natureza é Amar-te mais ou menos assim, num caos permanente em mim.
Se um dia me perguntares como é que eu ando e eu responder que estou arrumadinho, então é porque deixei de te Amar. Mas não contes com isso. 

10.28.2015

coisas que fascinam (196)

Prefiro-te azul, se puder ser. Se fores azul, basta-me olhar para cima para te encontrar, mesmo quando não estás.
Aconteceu-me agora mesmo. Na rua cinzenta todos tentavam proteger-se da chuva que começava a cair. Um cão escondeu-se debaixo de um automóvel ainda quente, uma mulher encostou-se à montra de uma loja chinesa e um homem entrou de improviso num café sobrepovoado. Provavelmente nem soube bem o que pedir quando se sentou no balcão.
Na aguarela enegrecida do céu, procurei-te durante um momento. Encontrei-te. Acontece-me de dez em dez segundos.

10.26.2015

coisas que fascinam (195)

ser um tolo sem arte

Dizem que quem parte e reparte e não fica com a maior parte ou é tolo ou não tem arte. Isto é verdade no caso dos bancos e das entidades patronais. De resto, espero que não seja relativamente às pessoas, porque me parece que as pessoas que levam este provérbio a sério não podem ser minhas amigas.
Penso nisto numa noite em que me sento com um amigo à minha mesa e parto e reparto uma garrafa de vinho e um queijo de cabra curado. Partimos o que ponho na mesa sem olhar às partes, repartindo a amizade que temos de igual forma.
É assim também que se parte uma vida para repartir um Amor, em partes nunca iguais mas sem perceber qual delas é a maior e, sobretudo, sem perceber qual é a mais pequena, porque o grande problema de um Amor inteiro é que não cabe em parte nenhuma a não ser, às vezes, num abraço despido.
Quem parte e reparte e não fica com a maior parte pode ser tolo ou não ter arte, mas sabe muito melhor do que qualquer calculista manhoso o que é a Amizade e o que é o Amor. Eu sei que sou tolo e não tenho arte. Têm-mo dito quase toda a vida. Ainda assim estou apaixonado e a falar de um Amor sofrido com um Amigo, à minha mesa, com uma garrafa de vinho e um queijo cujas partes não me interessam.

10.23.2015

pensamentos catatónicos (337)

Às vezes tenho a sensação que podia Amar uma mulher. Podia, mas não Amo. O único motivo para que tal aconteça é outra mulher de quem gosto e que me ocupa o Amar por inteiro.
Não sei até que ponto isto é verdade, nem sequer me interessa saber. Às vezes a verdade nem sequer existe porque cada um de nós tem a sua. A minha verdade é esta. Disse isto a uma pessoa que eu não Amo, embora talvez pudesse Amar, e ela respondeu-me que me podia acontecer exactamente o contrário. Amar uma mulher apenas por causa de outra.
Do mesmo cruzamento podemos seguir direcções opostas. É por isso que aquela que seguimos tem sempre imenso valor.

10.21.2015

conversa 2169

Ela - Aposto que dizes mal de mim a toda a gente.
Eu - Por acaso só digo bem.
Ela - Custa-me acreditar nisso.
Eu - Porquê?! Se calhar tu é que dizes mal de mim, então.
Ela - Eu nunca faço isso. As pessoas que fazem isso são parvas e eu não sou parva.
Eu - Então e estavas a partir do princípio que eu sou parvo?
Ela - Vamos mudar de conversa.

coisas que fascinam (194)

Todos os Amores eram mais fortes se lhes adivinhássemos a saudade. Quando estamos com alguém que Amamos muito não somos capazes de imaginar o fim desse Amor, até porque tudo parece perfeito e ninguém crê que o fim faça parte da perfeição.
Imaginar a nossa vida sem aquele Amor com que vivemos é simultaneamente um sonho e um pesadelo. Um sonho porque estamos de facto a vivê-lo, um pesadelo porque nos apercebemos que podemos não o viver mais.
Adivinhar a saudade de um Amor faz com que o tratemos melhor. Corrijo, adivinhar a saudade de um Amor faz com que o tratemos Amando-o. Todos os Amores deviam ser tratados assim, mas às vezes não são.
E eu, que não acredito na perfeição nem gosto da palavra, pouco mais faço actualmente do que adivinhar a saudade. É por isso que estou à espera que o Amor me bata à porta um dia qualquer. No máximo até aos meus oitenta anos de vida. Depois desisto.

10.18.2015

conversa 2168

(entre adolescentes, no comboio Aveiro-Porto)

Ela - Prefiro que me chamem puta do que feia.
Ele - Estás a brincar.
Ela - Não estou nada!
Ele - Mas porquê?!
Ela - Porque puta eu sei que não sou.

10.16.2015

pensamentos catatónicos (336)

gatos

Eu sei que todos os Amores acabam. Aprendi-o com as pessoas que pensam o contrário e que passam a vida inteira num desAmor constante. Sei que o nosso Amor também vai acabar. A única coisa que eu queria era que ele acabasse depois de nós.
Hoje sentei-me num muro velho que separa uma casa em ruínas duma estrada movimentada. Levei comigo um casaco azul e a solidão que tinha em casa. Creio que não me esqueci de nada. Fiquei a ver os automóveis a passar, todos na mesma direcção desconhecida. Ao longe, o trânsito automóvel é como cada um dos Amores deste mundo. Parece que vão todos na mesma direcção, mas não vão.
Um gato preto subiu ao muro e, depois de me fitar durante alguns segundos, ficou também a olhar para a estrada. Acho que ele me leu o pensamento. A diferença entre mim e ele é que ele aceita essa verdade com naturalidade. Eu não. Se algum dia tornar a andar contigo de carro, vou estar atento aos gatos que olham para o trânsito.
Acho que só os gatos é que percebem que eu desejo sempre que a estrada não acabe. Seria uma forma de, mesmo contigo a conduzir em silêncio, estar sempre perto de ti. O Amor é eternizar cada momento de proximidade, se possível até depois de nós.

10.13.2015

respostas a perguntas inexistentes (346)

Amor à primeira vista

Um dia destes vou tentar perceber porque é que se fala apenas do Amor à primeira vista. E os Amores à primeira audição, ao primeiro toque, ao primeiro aroma ou ao primeiro sabor? São tão ou mais importantes que o da vista, mas ninguém lhes liga nenhuma.
Acho que é por isso que todas as histórias de príncipes e de princesas são sempre uma boa merda. A Disney, por exemplo, só nos apresenta a visão como elemento fulcral da paixão. Mas que erro mais limitador e que péssimo exemplo para quem é criança. Corremos o risco de crescermos a pensar que o Amor é apenas aquilo que vimos e chegar a adulto sem saber Amar. A Disney é apenas pornografia barata.
Quem tem saudades de um Amor tem saudades muito para além daquilo que viu. Eu, que sinto uma enorme saudade de tudo o que me lembro no escuro de um quarto, estou-me nas tintas para a visão. A escuridão é o meu ninho, onde o Amor ultrapassa totalmente os meus olhos enganadores.
Nunca me apaixonei de verdade por ver uma mulher, mas já me apaixonei por um segredo contado ao ouvido, um toque de uma mão ou o cheiro de um abraço apertado. Talvez o melhor dos Amores seja aquele em que a vista começa a ver realmente depois de tudo o resto.

conversa 2167

Ela - Quando me divorciei, decidi dar um tempo a mim mesma para ficar sozinha. Entretanto, já lá vão doze anos.
Eu - Mas vês isso como algo mau na tua vida?
Ela - Nem sei bem. Às vezes apetecia-me ter alguém, mas acho que tenho medo de estragar a paz em que vivo.
Eu - Eu percebo... e nunca tentas uma relação em part-time?
Ela - Em part-time?!
Eu - Sim, vivendo em casas separadas e assim...
Ela - Não. Um Amor é para estar sempre bem acompanhado.
Eu - A não ser que seja melhor estar só do que bem acompanhado.
Ela - Como é que se chama o vinho branco que estávamos a beber?
Eu - Azinhaga de Ouro. É Douro...
Ela - Podes abrir outra garrafa? É a primeira vez que ouço semelhante coisa...

10.12.2015

respostas a perguntas inexistentes (345)

que o Amor não me engane

Um homem e uma mulher nunca se Amam de verdade. Podem ter os dois uma enorme vontade de fingir que sim e, nesse caso, fazem um esforço que pode durar uma vida inteira. O fim desse esforço é o fim do Amor ou, em casos de perseverança, o fim da vida é que é o fim do Amor. De qualquer forma, o Amor exige sempre esse esforço.
Ainda assim, um homem e uma mulher podem Amar-se em mentira. Não faz mal nenhum esforçarmo-nos quando Amamos alguém em mentira, para que tudo pareça verdade. O que temos que aprender é a não deixar que o Amor nos minta a nós, para sermos nós a mentirmos-lhe a ele. É que quando ele nos bate à porta pela primeira vez, tudo parece fácil. Algum tempo depois é que ele nos diz que não é bem assim.
Quando eu e ela discutíamos, eu optava sempre por me calar. Um dia ela disse-me, num tom acusatório, que eu nem sequer tinha opinião sobre as coisas. A minha mentira era essa, mas eu preferia o silêncio à verdade.
Acho que no dia em que a vi partir, deixei-a ir tão facilmente por a saber tão verdadeira que nem sabia fingir que o nosso Amor era verdade.

10.09.2015

respostas a perguntas inexistentes (344)

cócega

Foi contigo que descobri que o Amor é uma cócega. Não sei se te lembras, mas um dia toquei à tua campainha e mandaste-me subir pelo intercomunicador, Quando cheguei ao teu quarto andar a porta estava aberta e tu lá para dentro, numa divisão qualquer fora de vista. Fiquei a limpar a sola dos sapatos no teu tapete da entrada durante alguns minutos até tu apareceres e me perguntares porque é que eu não entrava.
Não to disse na altura, mas não foi vergonha nem timidez. Foi uma cócega. Estar na iminência de te ter fez-me querer ficar assim, feliz para sempre por estar quase. Foi uma cócega. Depois entrei e fizemos Amor, já não sei se durante cinco minutos ou uma hora. Sei que no fim te levantaste para ir às compras e, nesse momento, voltei a querer estar a limpar os pés à tua porta, feliz para sempre por estar na iminência de te ter.
Há muitas formas de Amar, provavelmente tantas quantas as pessoas que Amam alguém. Em tantas formas de Amar, a nossa é sempre a pior, por ser a mais intensa e também a única que permite a quem Ama sofrer. 
Faz-me uma cócega, por favor, tão leve e despreocupada quanto outra coisa qualquer. Abre-me a porta. Eu prometo não entrar.

10.08.2015

coisas que fascinam (193)

Hoje perdi as minhas chaves e atrasei-me a um encontro por causa disso. Tinha a porta de casa aberta mas sabia que, se saísse, não voltava a entrar facilmente. Infelizmente, o mundo não está virado para sairmos e deixar o que é nosso ao Deus-dará. Procurei nos bolsos das calças que tinha atirado para dentro da máquina de lavar, nas confusas estantes do meu quarto e no labirinto desarrumado da sala de estar. Nada. Demorei um quarto de hora a perceber que estavam no bolso do casaco que eu havia de vestir assim que saísse, talvez porque os lugares onde procurei primeiro fossem os mais óbvios.
Podemos perguntar também onde está o nosso Amor quando não sabemos dele. É legítimo. Às vezes o Amor é apenas algo que se perdeu e tudo o que se perde pode encontrar-se de novo. Se não pode, pelo menos faz bem acreditar que sim. Acreditemos que é uma questão de procurar, então. Mesmo que não seja, claro.
Cheguei atrasado porque tinha demorado a encontrar as minhas chaves de casa. Ela não se chateou, pelo menos a julgar pelo sorriso largo que fez assim que abriu a porta. Abraçou-me e deu-me a mão, como se eu precisasse de um guia para os dez metros que distanciam a porta de entrada da casa dela da sala. Depois largou-me como se larga um balão de ar quente e eu não voei. Fiquei ali, preso ao doce suor da mão dela.
Tirou-me um café com um fundo de aguardente, pôs música a tocar no velho rádio que conheço do tempo em que ela me dava a mão todos os dias e esticou as almofadas que adornam o sofá. O gato dela resmungou um pouco e depois assumiu a propriedade de uma delas. Ri-me. Ela também.
Ali, numa sala que já foi minha, procurei o meu Amor como se procura um objecto qualquer. Até o procurei nos olhos claros dela e nos cabelos que voavam em electricidade estática. Procurei-o em cada canto da memória, mas não o encontrei nestes lugares óbvios. Já não está lá.
Talvez esteja mais perto de mim, numa espécie de bolso de casaco que hei-de vestir outra vez um dia destes.

10.07.2015

coisas que fascinam (192)

Há mulheres que todos os dias me salvam a vida, apesar de nem sequer o saberem. Nunca lhes agradeço porque nem sequer as conheço pessoalmente. Falta-me a confiança para tal. Ainda assim, o que me resta é imaginar que lhes faço também esse pequeno favor. Salvar-lhes a vida todos os dias.
Assim que encostei os cotovelos ao balcão e lavei em seco a cara com as palmas das mãos, ela aproximou-se e retirou dois ou três copos de cerveja já bebidos por clientes que não cheguei a ver. Depois disse-me que estava à minha espera.

- À minha espera?!
- Sim. Tive aqui um cliente tão chato que precisava de alguém mais simpático.

É assim que ela me salva a vida todos os dias, a mentir-me sobre mim mesmo. Depois tirou-me um café que, ela já sabe, bebo sem açúcar. Sorri-lhe timidamente e perguntei-lhe se precisava de alguma coisa, sabendo eu que a resposta ia ser que não.
Perguntar a uma pessoa se precisa de nós mesmo sabendo que ela não precisa, às vezes, é o mais legítimo do mundo. Estamos apenas a afirmar que se pudéssemos fazer alguma coisa por ela, fazíamos mesmo.
É como se todos precisássemos de alguma coisa que não sabemos bem o que é, mas sabemos que é em alguém que se encontra e, até encontrarmos alguém que nos salve todos os dias com a vida, vamos visitando quem nos salva a vida todos os dias.

10.06.2015

conversa 2166

Ela - Ando mesmo com a auto-estima pelas ruas da amargura.
Eu - Eu percebo. Nunca é fácil acabar um Amor... mas o tempo cura tudo.
Ela - Eu sei que o tempo cura tudo, mas enquanto não cura...
Eu - Enquanto não cura, tens que gostar de ti mesma um bocadinho.
Ela - Eu gosto de mim mesma. Não penses que não.
Eu - Óptimo!
Ela - Na verdade, adoro-me! Sou a pessoa de quem gosto mais no mundo.
Eu - Também não precisas exagerar.
Ela - Adoro-me tanto que não sei como é que aquele animal me deixou!

10.05.2015

pensamentos catatónicos (335)

Quando alguém sofre por Amor, explicar-lhe aquilo que ele já sabe não ajuda nada. Só piora. É que de um Amor, tudo o que se sabe é que ele dispensa a sabedoria.
Por mim, fazia já um abaixo-assinado para pedir ao mundo que não dê conselhos sobre desAmores alheios. Os conselhos são apenas mais matéria para o mal estar. Nunca ninguém se apaixonou através do pensamento dedutivo, nem sequer tirou uns dias para decidir se se devia apaixonar ou não. É por isso que o processo inverso também não é inteligente. Ou te apaixonas, ou não. Ou te desapaixonas, ou não.
Dizer a alguém que não devia gostar de alguém é tão inteligente quanto pouco. Vem sempre de quem sabe analisar especificidades mas não consegue perceber o todo. A especificidade é uma batata. O todo é o Amor.
Um abraço, no entanto, muda tudo nem que seja só por um momento. Às vezes, em vez de palavras, deviam surgir abraços.

10.03.2015

conversa 2165

(ao telefone)

Ela - O meu marido está lá fora, no carro, à minha espera.
Eu - Okay, então falamos depois...
Ela - Não, não. Podemos falar agora.
Eu - Para não fazeres o teu marido esperar...
Ela - Eu quero fazê-lo esperar. Há muito tempo que não temos uma discussão.
Eu - Queres ter uma discussão com o teu marido?!
Ela - Só para ver se ele ainda reage a qualquer coisa. Tem andado tão mortinho...

10.02.2015

conversa 2164

Ela - Sabes... às vezes olho para trás e tenho pena de nunca me ter apaixonado por ti.
Eu - Apaixonaste-te por outros. Isso não se controla.
Ela - Pois... mas tenho a sensação que...
Eu - Que quê?!
Ela - Que sempre me meti com homens demasiado inteligentes.
Eu - Estás a chamar-me burro?
Ela - Não. Não sei bem explicar...

respostas a perguntas inexistentes (343)

dá trabalho

Há pessoas que não sabem estar sem fazer nada. Quando estão desempregadas, por exemplo, utilizam esse argumento para a urgência de encontrar trabalho. Não sei se não acredite nessa desculpa esfarrapada ou se tenha pena. Mas que essas pessoas me fazem confusão, lá isso fazem. Sempre procurei trabalho essencialmente por precisar de dinheiro.
O meu ponto de vista é que a vida dá trabalho, pelo menos para quem a sabe viver. Foi por isso que nunca me senti estar sem fazer nada, mesmo quando estava sem emprego. Uma das coisas que dá trabalho na vida, por exemplo, é Amar uma só pessoa (Amar muitas não dá assim tanto).
A minha vida sempre me deu trabalho, ser eu próprio sempre me deu trabalho, Apaixonar-me perdidamente por uma mulher sempre me deu trabalho. É por isso que me assusta quando uma mulher me diz que não sabe estar sem fazer nada. Concluo que ela pode não saber viver nem sequer Amar alguém.
O que eu estou a dizer não implica que o trabalho seja sempre um sofrimento. Não é e, aliás, já tive trabalhos que me deram bastante prazer. Assim como Amar já me deu sofrimento e prazer. O que era bom era que todos fossemos nós antes de sermos outra coisa qualquer. Dá trabalho, mas vai valendo a pena.
Às vezes nem reparamos que trabalhamos oito horas por dia e nos cansamos mais depressa de um Amor que vemos apenas uma ou duas horas. Quando isso acontece, provavelmente deixámos de ser nós próprios. Se nós formos nós próprios, nunca estamos sem fazer nada e nunca nos fartamos da vida. Só que dá trabalho.

10.01.2015

respostas a perguntas inexistentes (342)

Quer dizer

Lembro-me da insistência dela para que eu falasse. Quer dizer, nunca percebi muito bem se ela queria apenas que eu falasse ou que eu dissesse. É que falar e dizer são coisas totalmente diferentes, e eu estava numa de silêncios. O silêncio, para mim, era a nossa intimidade, e ela não devia precisar que eu o quebrasse.
Depois disso o nosso Amor morreu. Quer dizer, não morreu duma vez. Foi morrendo um bocadinho todos os dias. Não me importei muito porque nem cheguei a ver o cadáver. Quando morreu, morreu já longe. Creio que numa estrada nacional à noite. Ela ligou-me e disse-me que já não vinha mais. Pelo menos durante um tempo, referiu. Eu assenti com um "hum, hum". Estava zangada. Percebi sem que mo dissesse.
Nesse telefonema, há alguém que não sabe que eu ouvi o ruído do motor da sua motorizada a passar lá atrás e que, nesse momento, o comparei ao que nos tinha acontecido aos dois. O nosso Amor tinha sido um ruído assim, a crescer tão rapidamente como a desaparecer numa estrada que eu não percorrera. Quer dizer, três semanas. Creio.
Um Amor precisa de se entender nos silêncios, porque é nos silêncios que os olhares se explicam melhor. E o corpo, já agora. Nunca lho disse, mas quem pede tanto que se fale é porque não sabe o que o silêncio quer dizer. Quer dizer tudo, quer dizer.