5.31.2010

conversa 1528

Ela - Eu devia era ser daquelas boazonas todas giras.
Eu - Porquê?
Ela - Para arranjar emprego como hospedeira duma companhia aérea. Apetecia-me ter um emprego que me permitisse viajar.
Eu - Não acho que todas as hospedeiras sejam dessas boazonas e giraças que estás a pensar. Podes candidatar-te à vontade...
Ela - Ei! Devias era ter dito que eu sou muito gira...
Eu- És bonita, sim. Não disse que eras feia. Mas pareceu-me que estavas a falar daquelas mulheres tipo capa da Playboy...
Ela - Portanto achas que sou suficientemente bonita para hospedeira de bordo mas não para capa da Playboy. É isso?
Eu - Mas... tu é que estavas a dizer...
Ela - É melhor acabar por aqui esta conversa.

5.28.2010

bom fim de semana

Perguntam-me porque é que ponho sempre um sorriso nas respostas aos comentários. A resposta é fácil: apetece-me. Devemos fazer o que nos apetece se isso não prejudicar ninguém. Agora, por exemplo, apetece-me desejar um bom fim de semana a todos vocês. :)

conversa 1527

Ela - Há homens que não percebem que podem ser amigos duma mulher. São esses homens que, sempre que vêem um outro homem com uma mulher partem do princípio que se andam a comer um ao outro.
Eu - Sim, acho que é verdade. Alguns homens talvez pensem assim. Não todos.
Ela - Claro que não são todos, felizmente. Tu, por exemplo, tens muitas amigas. Se calhar tens mais amigas do que amigos.
Eu - Sim, acho que sim. Tenho mais amigas do que amigos.
Ela - Já viste se tivesses ido para a cama com todas elas? Era um exagero...
Eu - Pois...
Ela - Mas tira esse ar de satisfeito.

respostas a perguntas inexistentes (89)

Hoje fui ao médico. Quando se vai ao médico é porque se suspeita que se pode estar doente. Eu suspeito. O médico mandou-me fazer uma série de análises mas acalmou-me. Não estás a morrer, disse-me. Estou sim, respondi-lhe. Espero é estar a morrer ao mesmo ritmo do meu envelhecimento. Não disse isto por nenhum motivo especial. Saiu-me. Só isso. Depois fui tomar café.
Gosto muito de café mas nem sempre o tomo por gostar dele. Tomo-o para poder estar sozinho no meio de muitas pessoas que não conheço de lado nenhum. E estive. Reparei que quase todas as pessoas que eu não conhecia de lado nenhum também tomavam café. Talvez o fizessem pelo mesmo motivo que eu e, nesse caso, era eu uma pessoa que elas não conheciam de lado nenhum. Foi isso que me fez olhar para elas com atenção redobrada.
Afinal conhecia uma delas. Um velho amigo que emigrou para a Holanda há uns anos atrás. Cumprimentei-o e mudei-me para a mesa dele. Então e a vida? É sempre o que se pergunta a alguém que não vemos há muitos anos. A vida, disse ele, está a zero. Voltou da Holanda por se ter apaixonado e desapaixonado por lá. Não se consegue viver num país em que nos apaixonámos e desapaixonámos, pois não? Não, confirmei eu. A não ser que seja o nosso.
Saímos do café ao mesmo tempo e demos um abraço. Acho que nunca tinha dado um abraço a um amigo que já não via há anos. Isso fez-me pensar que somos mesmo amigos. Pelo menos éramos. Perguntou-me pela minha vida. Os que são mesmo nossos amigos também perguntam sempre pela nossa vida. Acho que estou doente e tenho a certeza que estou apaixonado, respondi. A certeza mesmo? Sim. Doente de quê? Ando com umas tonturas repentinas, não sei bem porquê.
Uma criança com um prato de plástico em forma de volante interrompeu-nos. Apitou e disse que queria passar. Pi! Pi! O meu amigo deu-me uma pancada no ombro. Isso não é nada, disse. Depois foi-se embora. Acho que estava a precisar dessa pancada no ombro. Às vezes é preciso. Ter tonturas e estar apaixonado é uma sorte, pensei depois. Até porque as tonturas se resolvem.

5.27.2010

conversa 1526

Ela - Apetece-me casar.
Eu - Casar com quem?
Ela - Com o meu namorado.
Eu - Ah! Não sabia que... quem é o felizardo?
Ela - Qual felizardo?
Eu - O teu namorado...
Ela - Eu não tenho namorado. Sabes muito bem.
Eu - Como disseste que te apetecia casar...
Ela - Sim, se eu tivesse um namorado pedia-o em casamento agora.

coisas que fascinam (104)

Ela aceitou sair comigo sem hesitar. Fiquei espantado porque, até então, nunca tinha havido nenhuma troca emocional entre nós. Nem um só pedacinho de ternura. A nossa vida era o olá de manhã e o tchau seco ao fim da tarde numa escola de que nem gostávamos muito. Apaixonei-me por ela só por isso, por ela aceitar sair comigo sem hesitações apesar do grande nada que existia entre nós. E eu que já me tinha convencido que as miúdas todas da escola se achavam especiais a partir do momento em que eram convidadas para sair, e que só isso lhes dava o direito de hesitar. Afinal não.

As hesitações vieram depois. Andámos muito a pé. Nós e o sufocante calor de Maio a anunciar trovoada, numa permanente expectativa dum abraço. Os cinco centímetros que nos separavam eram margens dum rio pouco navegável para a minha coragem adolescente. Fui esticando o tempo, fui esticando o desejo, fomos esticando as palavras. Esticámos o tempo até à hora de a levar a casa. Meia-note, tinha-lhe dito o pai.
Vi-a subir o primeiro lance de escadas e ser cruelmente engolida pelo elevador. Dei uns passos atrás e fiquei à espera que ela aparecesse numa das janelas para me dizer adeus. Apareceu numa varanda uns segundos depois e acenou-me. Foi a primeira mulher por quem esperei debaixo duma varanda. Agora lembrei-me disso...

5.26.2010

conversa 1525

Ela - Acreditas que desde que tive o meu primeiro filho comecei a pensar mais vezes na morte?
Eu - Hum... hum...
Ela - Acho que isso acontece mais com as mulheres.
Eu - Hum... hum...
Ela - A ti não te aconteceu?
Eu - Não me aconteceu o quê?
Ela - Pensares mais na morte, depois de nascer a tua filha...
Eu - Na morte de quem?
Ela - Esquece. Às vezes é impossível falar contigo.
Eu - Desculpa. Pões-te a falar da morte comigo enquanto estou a fazer as palavras cruzadas...
Ela - Deixavas de fazer as palavras cruzadas e pronto.

respostas a perguntas inexistentes (88)

o orgasmo

Fala-se demais no orgasmo sexual, seja em conversas de café, no cinema ou na literatura. Quando somos putos e inexperientes chegamos a pensar que ter um orgasmo deve ser qualquer coisa muito parecida com tomar LSD ou ter uma trip parecida. Não é. Aliás, ter o orgasmo como único propósito no acto sexual é o primeiro dos erros. O sexo é sempre bom. Às vezes vem com orgasmo, outras vezes não... mas é sempre bom. E é bom não por esses segundos finais mas por todo o tempo que durou.
Aconteceu-me há bocado, durante um café solitário, ouvir duas miúdas novinhas a descrever a sua primeira experiência sexual. "Chegaste ao orgasmo?" perguntavam uma à outra. Que sim, afirmavam repetidamente descrevendo a experiência como uma espiral em arco-íris. E riam-se. Entendi o riso como um riso nervoso de quem não teve o que estava à espera mas não tem experiência suficiente para o admitir. Provavelmente estiveram com um miúdo qualquer que teve a mesma ânsia: chegar ao fim sem olhar a meios, porque o fim é tudo.
A questão é que no sexo o fim não é tudo. Aliás, não é quase nada. O tudo está no durante. Saí dali a pensar que se fala pouco em sexo neste país e quando se fala normalmente fala-se mal. Por isso é que se fala demais no orgasmo. O sexo continua a ser uma coisa de esgoto. Portanto o amor também...

5.25.2010

conversa 1524

Ela - Acho que nunca na vida vou encontrar uns óculos escuros para mim.
Eu - Nunca mesmo?
Ela - Nunca. Tenho a cara muito pequena e pareço uma mosca com a maior parte dos óculos escuros que experimento.
Eu - Experimenta uns pequenos...
Ela - Não gosto de óculos escuros pequenos. O problema é esse...
Eu - Não gostas?
Ela - Não.
Eu - Então pronto, andas sem óculos escuros. Não é grave.
Ela - É grave porque no Verão engelho a pele junto aos olhos.
Eu - Estás num dia mau, não estás?
Ela - Estou.

conversa 1523

Ela - Esqueci-me da minha carteira no café. Tenho que voltar para trás.
Eu - Ena... tinhas lá o dinheiro?
Ela - Não, por acaso o dinheiro até tenho no bolso das calças.
Eu - Menos mal.
Ela - Mas na carteira tenho os documentos todos, um pacote de bolachas de água e sal para o lanche da tarde, uma garrafa de água com fibras, um brinde Happy Meal para a minha filha, uma camisola com buracos nos cotovelos para levar à retrosaria, uma calculadora solar, um molde em papel dos meus sapatos e um pacote de mentos.
Eu - Ah! Vai lá, então.

5.24.2010

respostas a perguntas inexistentes (87)

Não é só por causa da má qualidade da comida que não gosto de restaurantes fast food. É por causa da primeira palavrinha dos mesmos: fast. Sempre me pareceu que quem come regularmente este tipo de comida é quem procura a satisfação imediata das suas necessidades biológicas e, se fizer uma análise estatística à minha vida amorosa, chego facilmente à conclusão que nunca tive sucesso com mulheres adeptas de comer regularmente no Mac Donald's. São pessoas que se tornam impacientes, e depois essa busca ansiosa pelo estímulo rápido reflecte-se em tudo: nas decisões que se devem tomar em conjunto, no amor em si e até no sexo.
Sou pelos jantares lentos. Pela slow food, se lhe quiserem chamar assim. Gosto de ouvir o som da rolha a sair duma garrafa de vinho antes da refeição e de o deixar respirar; gosto do molho verde com a cebola bem picada e a salsa bem cortada; sobretudo gosto de falar enquanto almoço ou janto. As palavras têm sempre que ser um dos ingredientes duma refeição.
Hoje passei por dois rapazes e duas raparigas na praça de alimentação dum shopping em Aveiro, todos a almoçar um hambúrguer com batatas fritas e um refrigerante qualquer. Reparei que não falavam. Limitavam-se a mastigar a comida numa incompreensível luta contra o tempo. Acho tão importante andar mais devagar... tanto na comida como no amor...

conversa 1522

(no café, comigo a ler uma revista)

Eu - Olha que giro. Vem aqui a lista das invenções mais importantes da Humanidade. A roda, o avião, a lâmpada, a penicilina, o telefone... e vem também o Iphone. Que estranho, esta do Iphone...
Ela - Não me digas que não vem o sutiã!

conversa 1521

Ela - Nunca mais me esqueci daquela conversa que tivemos quando andávamos no liceu...
Eu - Que conversa?
Ela - Não me digas que não te lembras.
Eu - Se foi quando andava contigo no liceu, sei lá... já foi há uns vinte anos.
Ela - Mas não te lembras?
Eu - Tive tantas conversas contigo no liceu...
Ela - Mas há uma conversa que era suposto não te esqueceres.
Eu - Qual?
Ela - Deixa lá, não te vou dizer...

pêra


O perfil duma pêra não é perfil para uma mulher, dizia a Warner's, marca de roupa interior que também apresentava uma solução para as mulheres mais largas em baixo do que em cima. Mulheres de todo o mundo que não são totalmente perfeitas: sintam-se mal! muito mal!

5.22.2010

respostas a perguntas inexistentes (86)

Hoje dei o primeiro mergulho mar. Percorri alguns metros em passos lentos para me ir habituando à temperatura da água até ganhar coragem para furar uma onda. No entanto não faço sempre isto. Às vezes prefiro mergulhar mal ponho o pé no mar e não passo por esse processo de habituação.
Acho que entre géneros também é mais ou menos assim. Já conheci algumas mulheres em quem me apeteceu mergulhar logo na primeira noite, outras em quem me fui habituando aos poucos, sem que este mergulhar tenha obrigatoriamente uma conotação sexual.
Entretanto, acho que na vida vamos também aprendendo que há ondas em que não devemos mergulhar...

5.21.2010

todos os homens bêbados o são por causa do amor

Todos os homens bêbados o são por causa do amor. Na pior das hipóteses são-no por causa da falta dele, o que vai dar ao mesmo mas com uma dose de tristeza e nostalgia acrescida. A sociedade devia tratar bem os bêbados e não escorraçá-los com aquela sóbria sobranceria de quem não ama ninguém.
Um homem só, bêbado ao balcão de um bar, afoga no líquido do copo os seus amores acabados; o jovem estudante bêbado que grita na rua qualquer coisa como "fra fre fri fro fru", celebra com a sua bebedeira os amores que acredita poder vir a ter; aquele que normalmente já está bêbado pela manhã é um homem que não consegue enfrentar o amor. Depois também existem os que bebem para se poderem aventurar no amor, os que sem a coragem dada pela mágica poção do álcool não conseguem dizer que amam.
Além disso, só o álcool e o próprio amor são capazes de embriagar um homem, facto que coloca estes dois elementos da natureza como a principal essência da vida. Estar sóbrio é o contrário de amar. Pior: estar sóbrio é a recusa de amar. Um homem sóbrio pode dizer a uma mulher que a ama, mas quando o faz as palavras nascem-lhe no céu da boca e saem sem pressão. Quando um homem bêbado diz a uma mulher que a ama as palavras não lhe nascem na boca, nascem-lhe no coração. É por isso que quando chegam cá fora já trazem uma lágrima ou um sorriso a enfeitá-las. Já percorreram um longo caminho de emoções.
Todos os amores deviam começar numa enorme bebedeira e a bebedeira devia ser protegida por lei. Um polícia, por exemplo, ao ver um bêbado adormecido numa esquina qualquer, devia cumprir o seu dever de serviço público e tapá-lo com um cobertor. Uma sociedade que acarinha os bêbados acarinha também o amor.

5.20.2010

come on baby light my fire!

Uma equipa de cientistas alemães acredita ter descoberto o brinquedo sexual mais antigo do mundo, um pénis de pedra com cerca de 28 000 anos. O artigo publicado no Austrian Times diz ainda que, quando este antepassado dos actuais vibradores não estava a ser usado sexualmente, servia para fazer fogo. A mim, o que me parece, é que há muito tempo, mas mesmo há muito tempo, que as mulheres se tentam livrar dos homens...

pensamentos catatónicos (208)

Quando eu era pequeno aprendi que o amor era uma instalação. Supostamente devia um dia instalar-me numa mulher da mesma forma que me vim a instalar num T2 dos subúrbios da cidade: é maneirinho, barato e até tem acessos a uma via rápida. Depois de me instalar devia arrumar os cacos da melhor maneira e ir varrendo ou aspirando o cotão atrás das portas.
O problema é que não é suposto o amor ser maneirinho ou barato, muito menos ter acessos a vias rápidas. Num amor assim acabamos a limpar o cotão todos os dias sem saber porquê, num acto mecânico de manutenção ausente. Não é por isso, também, suposto sentirmo-nos instalados. Quando nos instalamos dessa forma o amor morreu...

o direito de pernada ou o valor de uma jovem virgem...

O direito de pernada, ou direito da primeira noite, permitia ao senhor feudal desvirginar a noiva na sua noite de núpcias caso os recém casados pertencessem aos seus domínios territoriais, ou seja, fossem camponeses. A produção de riqueza, na idade média, estava essencialmente na agricultura e um pouco nos artesãos.
Os camponeses que conseguiam fugir desses domínios territoriais e chegar a um aglomerado urbano, ou vila, viam-se livre dessa escravidão se aceitassem pagar o imposto. Passavam a chamar-se vilões.
Com o fim do feudalismo e o crescente modelo capitalista, o direito de pernada foi passando do senhor feudal para o burguês. A virgindade feminina passou assim a ter um valor cada vez maior num mundo onde as doenças sexualmente transmissíveis proliferavam.

conversa 1520

(ao almoço, em minha casa)

Ela - Vais fazer a salada com essa alface?
Eu - Qual é o problema da alface?
Ela - Está molhada.
Eu - Está húmida, sim, mas isso é porque a lavei.
Ela - Tenho que te oferecer um secador de legumes.
Eu - Um secador de legumes?
Ela - Sim, um secador de legumes.
Eu - Nunca tinha ouvido falar em tal coisa...
Ela - É essencial ter um em casa. É um tupperware mas que faz centrifugação.
Eu - Essencial não deve ser. Eu nunca tive nenhum e estou vivo.
Ela - Para mim é essencial que um homem que me convide para almoçar em casa dele e, no mínimo dos mínimos, não tenha a alface já lavada e seca, tenha um secador desses...
Eu - Repito que nunca ouvi falar em tal coisa...
Ela - Uma questão de cultura geral...

amanhã não é quarta-feira

Amanhã não é quarta-feira mas hoje à noite é noite de Couscous Prosjekt no Clandestino Bar. Muito provavelmente a Mart'nália e o Paulinho Moska são dois dos que vão passar por lá. Passem vocês também...

5.19.2010

conversa 1519

Ela - Eu cá acho que no sexo o tamanho importa.
Eu - Vá lá... admites.
Ela - Não estou a falar do tamanho de nenhum membro em especial, estou a falar do tamanho do corpo.
Eu - Do corpo? Bem, por acaso não acho que isso seja assim tão importante.
Ela - Isso porque nunca tiveste um gajo com o dobro do teu tamanho em cima de ti.
Eu - Não, não tive.
Ela - Opá, eu cá acho que os homens quando ficam por cima deviam ter mais força de braços. Uma mulher às vezes nem pode respirar...

pensamentos catatónicos (207)

Hoje de manhã, como noutro dia qualquer, os automóveis tomavam parte na enorme discussão em que a cidade se transforma em todas as horas de ponta. O meu também, admito, ora porque o condutor da frente demorou muito a perceber que o semáforo mudara para verde, ora porque uma carrinha pisou um risco contínuo para se meter à minha frente. Buzino, sem perceber que uma buzina é o pior que há em nós. Buzinar é repreender apenas pela forma e não pelo conteúdo, já que não se diz uma única palavra. É só um grito estéril de mensagem e pleno de raiva gratuita. É nisso que nos transformamos repetidamente todas as manhãs.
Hoje de manhã, como em nenhum outro dia, cansei-me. Encostei o carro e li o jornal lá dentro enquanto a discussão continuava. Acho que já houve momentos na minha vida em que o próprio amor foi assim: uma discussão de buzinas surdas. Ainda bem que, também aí, encostei para ler o jornal...

5.18.2010

respostas a perguntas inexistentes (85)

Numa relação a dois o tempo costuma ser um dos factores do sucesso ou insucesso da mesma. É quase imediato que se pense que uma relação é boa se já dura há muito tempo e que foi má se foi curta. Não é obrigatoriamente assim, e não acho que se deva ceder a uma relação que já só faça sentido pelo tempo que tem. No entanto também acho esse tempo importante, principalmente porque é esse tempo que nos permite viciar no outro. É ele que nos permite passar do estado do Amor-Novidade para o estado de Amor-Vício, e essa evolução de estados é o mais difícil de acontecer.

coisas que fascinam (103)

Este fim de semana, numa das despovoadas rua de Serpa, vi um pardal jovem que não conseguia voar. Já disse aqui que não nutro uma grande ligação por animais mas ainda assim, e como o mais provável era ele morrer, apanhei-o e levei-o a casa onde a minha filha lhe deu algumas migalhas de pão e algumas gotas de água.
Este pássaro obrigou-me a voltar para trás e a adiar uma cerveja com um prato de caracóis numa das esplanadas que pontilham aquela terra. A minha companheira, que também estava comigo, acompanhou-me neste improviso sem um único protesto ou hesitação. Não sei muito bem porquê mas isso fascinou-me. É como se pudesse mudar de rumo a qualquer momento sempre contando com ela.
Entretanto, e segundo a minha filha me disse ao telefone, o pássaro melhorou e já voou para longe.

conversa 1518

Ela - Gosto muito do meu marido mas às vezes dá-me uma vontade de viver sozinha!
Eu - Mas porquê? Falta de privacidade?
Ela - Não é bem isso. Ainda ontem à noite abri uma das portas do armário da cozinha e caíram-me em cima todos os tupperwares.
Eu - Isso é porque estavam mal arrumados. Já me aconteceu...
Ela - Isso é porque eu pedi ao meu marido para arrumar os tupperwares e ele, em vez de de o arrumar como deve ser, limitou-se a atirá-los para dentro do armário.
Eu - Mas querer viver sozinha só por causa disso...
Ela - Para ti tupperwares mal arrumados são só tupperwares mal arrumados. Para mim tupperwares mal arrumados são mais do que isso.
Eu - São o quê?
Ela - São a certeza que a minha vida vai ser um inferno.

5.17.2010

conversa 1517

Ela - Já alguma vez fingiste que estava tudo bem numa relação tendo a noção que na verdade estava tudo mal?
Eu - Já. Acho que todas as pessoas fazem isso pelo menos uma vez na vida.
Ela - Mentira. Todos os homens fazem isso pelo menos uma vez na vida. As mulheres não...

pensamentos catatónicos (206)

Não gosto de auto-estradas. Ponto final. Prefiro as velhas estradas nacionais, ruas, caminhos e vielas. A sensação de liberdade que uma auto-estrada nos dá, de podermos em pouco tempo sair de um sítio e chegar a outro, é uma ilusão. É que de facto podemos fazer isso mas sem nenhuma possibilidade de improvisação. As vias são fechadas e nem encostar à direita para esticar as pernas podemos. Numa auto-estrada não nos é possível parar fora daquele ambiente hermético das estações de serviço nem nos é possível mudar de percurso com facilidade.
Este fim de semana fiz uma viagem mais ou menos longa. Perto de Coruche, a minha companheira pediu-me para parar dez minutos junto de uma fonte na nacional 114 (acho eu) só para espairecer. Durante esses dez minutos senti-me feliz. Agora estava a pensar que, tal como na condução, também na vida prefiro estradas e ruas a auto-estradas.

5.14.2010

afastada professora que posou para a Playboy

Li no jornal que uma professora do 1º ciclo do Ensino Básico, numa escola em Mirandela, posou nua para a Playboy e foi consequentemente afastada pelo Conselho Directivo. Mais do que a Bruna ter sido alvo dum preconceito, aquilo que os responsáveis por este afastamento não percebem é que a Playboy, embora oficialmente seja uma revista só para adultos, é na verdade para crianças.
Quando eu era pequenino e conseguia juntar uns trocos da semanada que os meus pais me davam, era rapaz para percorrer toda a cidade a pé e ir comprá-la no quiosque mais longe possível do meu bairro. A nudez duma mulher representava tudo isso: o fruto proibido e a curiosidade por uma coisa que eu nunca tinha visto.
Agora a Playboy não me interessa absolutamente nada, assim como não interessará a nenhum adulto com uma vida emocional, cultural e sexual dentro dos generosos limites da normalidade. Eu, pelo menos, não estou a ver um gajo de quarenta anos a percorrer a pé cinco quilómetros para comprar uma Playboy num quiosque anónimo, embrulhá-la num jornal desportivo, e trazê-la para casa às escondidas só para conseguir ver mulheres nuas.
O entusiasmo que permite que se faça isso é um exclusivo das crianças e, por isso, ninguém duvide que são as crianças o público alvo da Playboy. Neste caso, a única diferença é que algumas crianças puderam ver a nudez duma mulher que conhecem e isso não me parece nada grave. Aliás, por falar nisso, a notícia também diz que a revista esgotou em Mirandela. Desta vez talvez não tenham sido apenas as crianças a comprá-la.

conversa 1516

Ela - Já te aviso para não mandares boca nenhuma.
Eu - Que boca é que eu te podia mandar?
Ela - Estou mal disposta e com os músculos faciais petrificados. Não consigo ser simpática.
Eu - E que boca é que eu te ia mandar?
Ela - Que eu estou sempre mal disposta, que devia sorrir mais e essas coisas. Não tenho paciência para isso...
Eu - Pronto, tudo bem. Eu estou calado.
Ela - Calado? Então e nem me perguntas por que  motivo estou mal disposta?

5.13.2010

os piropos de trolha como património da Humanidade...

Dantes as mulheres não trabalhavam. Quer dizer, trabalhar trabalhavam só que não tinham emprego. Elas ficavam em casa a tratar das tarefas domésticas e quem tinha emprego eram os maridos. É verdade que esta é uma das maiores injustiças da História dos géneros, primeiro porque à custa deste facto ainda hoje se diz que as mulheres dantes não trabalhavam, o que é manifestamente mentira; segundo porque elas não eram pagas pelo seu esforço, o que era uma exploração tramada; terceiro porque se havia alguém que não trabalhava eram os homens, não todos mas pelo menos aqueles que tinham empregos a fingir.
No grupo dos homens que tinham emprego e que efectivamente trabalhavam estavam os trolhas. A palavra trolha é, aliás, a primeira prova de que os maiores injustiçados nesta relação de género eram estes homens. É que para o comum mortal todos os que trabalhavam na construção civil eram trolhas, fossem eles pedreiros, electricistas, serventes, engenheiros ou canalizadores. Estavam num prédio, por isso eram trolhas e acabou-se. Porquê? Porque todos eles tinham uma coisa em comum: manifestavam-se sempre que uma mulher passava a menos de cinquenta metros da obra, ora com assobios, ora com gritos, ora com versos poéticos improvisados do género: "comia-te toda, oh! boazona!".
Hoje em dia os trolhas já não são como antigamente. Primeiro porque fomos invadidos por imigrantes do leste que, por serem letrados, têm a mania que devem respeitar tudo e todos; segundo porque entretanto os portugueses, com esse exemplo importado principalmente da Ucrânia, ganharam vergonha na cara. O problema é que eu tenho a certeza que as mulheres sentem faltam desse lusoaconchego em vias de extinção, e tenho a certeza porque eu sempre imaginei os edifícios em construção cheios de mulheres a trabalhar para poder ouvir o mesmo tipo de... poesia. Nunca ouvi, e acho que a minha vida foi mais triste por isso.
Por volta dos meus vinte anos, mais coisa menos coisa, ainda tentei passar repetidamente em frente das mulheres que ficavam em casa a limpar. Fiz uma lista com as casas do meu bairro e já sabia em que dia é que cada vizinha costumava ir à janela sacudir os lençóis ou pôr a roupa a secar e, metodicamente, passava mesmo em frente nesses dias a ver se alguma me dizia: "comia-te todo, oh! bonzão". Nunca aconteceu.
Acho que os piropos deviam ser considerados pela UNESCO património da Humanidade. Fazem falta, pá. Concordo que se diga habitualmente a uma mulher que ela é bonita, que é um amor, que se a ama ou que ela é a mais linda flor do nosso quintal. Viver uma vida inteira sem dizer algumas vezes que ela é boa cumó milho ou que com ela somos o homem erectus é que não pode ser. É como se tivéssemos um carro desportivo novinho em folha e nunca passássemos o limite da velocidade. Nem um bocadinho...

5.12.2010

conversa 1515

(ao telefone)

Ela - Estou um bocadinho atrasada. Não te vás embora, está bem?
Eu - Não te preocupes, estou a ver as gordas.
Ela - Gordas? Estão aí gordas? Vou ver se me apresso...
Eu - Estava a falar dos títulos dos jornais.
Ela - Ah!

5.11.2010

conversa 1514

(no café)

Eu - O que é que foi?
Ela - O que é que foi o quê?
Eu - Estavas a olhar para mim tão fixamente...
Ela - Sim, andas com a mesma camisola há pelo menos quatro dias.

eu amo-te

Há um primeiro dia em que falamos de amor. Antes desse dia somos sempre felizes, a partir desse dia somos felizes às vezes e outras nem por isso. Esse dia tem uma enorme importância no nosso crescimento, principalmente nos nossos processos cognitivos. Até esse dia achamos que o Sol nasce todos os dias para acordarmos e põe-se todos os dias para podermos dormir. A partir desse dia achamos estanho que ele continue a nascer e a pôr-se apesar de nós falarmos de amor. É que de repente deixámos de ter vontade de acordar e de adormecer. O amor é, portanto, o primeiro passo que nos afasta do egocentrismo.

Depois há uma escola, aquela em aprendemos tudo à nossa própria custa ou então, se calhar, nunca chegamos a aprender quase nada. Vamos aprendendo o que conseguimos e pronto. Primeiro a dar as mãos, depois a tocar os lábios no que um dia virá a ser um beijo, depois a trocar de pele no que um dia virá a ser sexo. Por fim, depois desses dias todos e de o termos dito já várias vezes, aprendemos finalmente a dizer "eu amo-te". A dizê-lo mesmo, sem ser só da boca para fora. É o primeiro dia em que dizemos realmente "eu amo-te". Antes desse dia somos felizes às vezes e outras nem por isso, a partir desse dia somos muito felizes às vezes e muito tristes outras.

Dizer "eu amo-te" é assim muitas vezes uma falácia. Eu, pelo menos, já o disse mentindo muitas vezes. Não mentindo a mais ninguém do que a mim mesmo, e que me lembre só não menti duas vezes. Estava aqui a pensar que talvez seja esse mais um degrau importante na nossa aprendizagem: aprender a não dizer "eu amo-te". É que há um dia em que aprendemos a não dizer "eu amo-te". Antes desse dia somos muito felizes às vezes e muito tristes outras, depois desse dias somos mais vezes felizes e menos vezes tristes. Acho eu...

querida, eu amo-te mas és muito flatulenta

Um senhor chamado Francis Bibbois inventou um cobertor, feito com um tecido de carvão activado, que absorve o odor da flatulência. Diz ele que este cobertor pode salvar um casamento. Ora bem... hum... hum... vá lá, não pode nada. Não é por causa da flatulência que um casamento acaba, pois não? Tipo: "querida, eu amo-te mas quero o divórcio porque és muito flatulenta". Se for, então é melhor comerem menos açúcar...

5.10.2010

Ana Maria Lucas, a janeleira

(clicar para ver maior)

Um destes dias sentei-me numa esplanada da praia só para beber uma cerveja e calhou abrir uma das revistas que estavam em cima da mesa. Deparei-me com uma página em que uma mulher, uma Ana Maria Lucas qualquer, se debatia para conseguir dizer mal do aspecto doutra mulher, neste caso a Liliana Aguiar. A rubrica chama-se "Cuidado Com as Aparências" e nela, a propósito duma fotografia da vítima, a Maria Lucas farta-se de tecer considerandos profundos sobre a sua vestimenta e no fim atribui uma nota à mesma.
Sobre a Liliana, esta mulher escreveu que a cor do cabelo não é boa e o penteado também não ajuda, que os brincos grandes não lhe parecem bem, que o casaco é completamente despropositado com o resto da tolilette e que a blusa talvez ficasse bem sem esse casaco (assim nem pensar). Depois dá-lhe a nota 3 de 1 a 10 aconselhando-a a reciclar-se, já que ainda é nova e tudo.
A Maria Lucas pode achar que é necessário ter cuidado com as aparências. Eu acho que é preciso ter cuidado com a língua e com ela a Maria não tem cuidado nenhum. Já nem estou a falar da inutilidade total daquilo que escreve, estou só a falar do descaramento que tem a analisar à frente de um país inteiro a forma como outra pessoa se veste.
Quando eu era pequenino, na rua duma aldeia que eu visitava às vezes no Verão, havia uma mulher que costumava ir para a janela fazer o mesmo: dizer mal da roupa que quem por ali passava trazia vestida. Eu costuma chamar-lhe "a janeleira" porque ela não fazia mais nada a não ser estar à janela. Depois explicaram-me que ela sofria de perturbações mentais...

conversa 1513

Ela - Ontem lembrei-me tanto de ti.
Eu - A sério?
Ela - Sim. Estava numa megastore chinesa com cuecas de homem tão horríveis.
Eu - Lembraste-te de mim por causa disso?
Ela - Sim. Estava a imaginar-te com umas brilhantes que lá estavam...

as fases duma chatice qualquer...

Acho que nunca na vida conseguiria ter uma namorada com quem não me chateasse de vez em quando. Não é que não queira, apenas não consigo. Portanto, as chatices que eventualmente tenha com uma mulher deixam de ser uma variável para gostar ou não dela.
Acho que as chatices não são sempre um confronto de ideias ou valores, nem sequer são uma crítica do tipo "fizeste isto ou aquilo mal". Quer dizer, parece que o são mas não o são de facto. Acho que por trás duma chatice está sempre um pedido amuado do género: "liga-me mais" ou "prova-me que me amas". É claro que estou a falar de chatices e não de pancada viva, entenda-se.
De qualquer maneira uma chatice é sempre uma chatice, seja porque ela bateu a porta do carro com demasiada força e ele não gostou, porque ela ficou demasiado tempo a falar com o empregado do restaurante e ele não gostou ou outra coisa qualquer. A grande diferença é que enquanto nos homens essa chatice se traduz normalmente por silêncios e respostas curtas a tudo, na mulheres traduz-se exactamente ao contrário, ou seja, ficam eléctricas e não param de falar. Isto porque normalmente eles esperam que ela adivinhe porque é que estão chateados, e elas nem sequer põem a hipótese que ele não tenham já adivinhado porque é que estão chateadas. Na nossa espécie temos o pequeno problema de não sermos adivinhos e por isso a coisa pode atingir proporções exageradas.
O problema real surge quando ela tem toda a razão e ele nem por isso. No meu caso, por exemplo, numa chatice deste género passa por três fases:

1] Fosca-se! Mas o que é que esta gaja quer?
Esta é sempre a primeira fase e é aquela em que estamos tão cegos que não aceitamos sequer que ela nos diga que o céu é azul. Até porque não é, ela é que anda com más companhias que lhe põem coisas más na cabeça.

2] Eu devia ter mais calma. Ela não tem razão mas eu exagerei na reacção.
Pronto, já bebemos um café e um uísque. A verdade é que o céu não é azul mas, coitadinha, devíamos explicar-lhe isso com calma até ela perceber.

3] E não é que ela tem razão?
Estranhamente, e contra todas as probabilidades e tudo aquilo que nos ensinaram na vida, o céu é mesmo azul. Esta é a altura de aproveitar, quando ela estiver calma, para fazermos as pazes...

5.07.2010

o amor faz bem

Diz-se que são loucos os que falam sozinhos. Somos todos loucos, portanto, pelo simples facto de pensarmos. Eu, que penso pouco, tenho em média um momento de loucura por dia, que é quando digo a mim mesmo que amar faz bem. E tento lembrar-me de mo dizer mesmo todos os dias. É uma regra.
Em criança fartei-me de ouvir velhos sábios a enumerar as coisas que supostamente me fariam bem durante a vida. Assim aprendi que a beterraba faz bem ao sangue, que a cenoura faz aos olhos, que o exercício faz bem ao corpo, que as palavras cruzadas fazem bem ao cérebro, que poupar faz bem à conta bancária e que o mercúrio faz bem às feridas. Nunca ninguém me disse que o amor faz bem.
Cresci e percebi a custo que esses velhos sábios falharam. Esqueceram-se do mais importante. Hoje de manhã acho que percebi porquê, porque é que eles falharam. É que não se consegue saber a que é que o amor faz bem, e mesmo dizer que faz bem a tudo é empobrecer a ideia. Devemos portanto dizer apenas que o amor faz bem, sem especificar a quê, e dantes, quando eu era criança, ninguém se atreveria a dizer uma coisa dessas. Podia parecer pecado.
Mas voltemos a hoje de manhã. Estava a chover depois de alguns dias de Sol e eu despedi-me da minha companheira com um beijo rápido, entrei no carro e acelerei em direcção ao emprego zangado com a chuva por isso mesmo. É que a chuva tem a mania de encurtar a duração dos beijos. Depois, no primeiro semáforo em que parei, um homem e uma mulher despediam-se. Ela ia a conduzir e ele ia aproveitar o sinal vermelho para sair. Entretanto mudou para verde e eles continuaram a beijar-se, com ele já de porta aberta e pernas de fora, aproveitando ainda o abrigo do automóvel. Eu ia buzinar para que eles se despachassem mas travei o meu impulso a tempo. Não ia fazer com que aquele homem fosse para o trabalho com a mesma sensação de beijo curto que eu tinha, pois não? Não, e quando ele finalmente acabou, olhou para mim e sorriu-me Acho que nos entendemos. É que o amor faz bem.

5.06.2010

conversa 1512

Ela - Acabei com o meu marido definitivamente.
Eu - Então?
Ela - Ele tinha a mania de aquecer demais os momentos sexuais.
Eu - Demais?
Ela - Sim, chamava sempre pelo nome de outra gaja.

conversa 1511

Ela - Quando eu fizer anos dás-me umas meias?
Eu - Umas meias?
Ela - Sim... adoro ter meias de todo o tipo e feitio. Às riscas, aos quadrados, com desenhos, lisas...
Eu - Está bem. Eu dou-te umas meias...
Ela - Isso e também a prenda que me darias se não me desses umas meias, claro.

conversa 1510

Ela - Já nem sei bem o que é que é preciso para que um amor corra bem.
Eu - Acho que é preciso que se dê a enorme coincidência de duas pessoas gostarem realmente uma da outra.
Ela - Sim, se calhar é só isso...
Eu (silêncio)
Ela - Bem... isso e ambos terem um emprego estável, serem do mesmo clube de futebol e do mesmo partido político, dividirem a meias o trabalho doméstico, não deixarem que os pais se metam não relação...
Eu - Estás a exagerar.
Ela - Nem por isso, nem por isso...

coisas que fascinam (102)

O que é fica duma relação que passa? Tudo menos sexo, diz-me ela enquanto tenta dominar os longos cabelos selvagens e prendê-los atrás da nuca com um lápis. O vento que veio tomar café connosco na esplanada da praia despenteia-a propositadamente por saber que a acho ainda mais bonita assim. E de facto é-o.
Depois lembro-me desta palavra, selvagem, como se ela fosse um trunfo na manga. Sempre achei que tirar uma tarde para falar com uma ex-namorada serve essencialmente para duas coisas: mostrar que não me esqueci dela e sentir que ela não se esqueceu de mim. Acho que é por isso que gosto de a ouvir dizer que fica tudo menos sexo. Assim fica ele e fico eu.
Acha que nunca gostou verdadeiramente de mim. Gostava de ter gostado mas não foi capaz, e diz que fui um abrigo numa era de temporal. Eu também acho o mesmo sobre ela. Às vezes o Amor é só um abrigo e digo-lhe que só é um só muito grande.

5.04.2010

surprise hotel

Hoje, só assim por acaso, é uma boa noite para passarem no Mercado Negro, em Aveiro, e ouvirem o som dos melhores djs do mundo. Pronto, não são bem os melhores...

conversa 1509

(ao telefone)

Ela - Aquele interruptor que trocaste em minha casa está mal posto.
Eu - Está mal posto? De certeza?
Ela - Sim. A luz não acende.
Eu - Já viste se a lâmpada está fundida?
Ela - Isso ainda não.

pensamentos catatónicos (205)

Há muito tempo que eu não o via. Passei por ele um dias destes numa das principais artérias da cidade e cumprimentei-o de soslaio. Estendeu-me a mão e perguntou-me como é que eu ando. Bem, respondi. Depois apresentou-me a mulher a que ia abraçado, primeiro afastando-a um pouco de mim para que os meus olhos a enquadrassem totalmente, e depois perguntando-me: "é bonita, não é?".
Era bonita, sim, mas eu nem respondi. Percebi-lhe a vergonha nos seus olhos escondidos. Não se apresenta uma mulher a um amigo desta maneira, pois não? Como se ela fosse um objecto de decoração. Olhei-o nos olhos e despedi-me fingindo-me apressado.

conversa 1508

Eu - Queres almoçar comigo hoje?
Ela - Onde?
Eu - Em minha casa. Hoje tenho tempo para fazer o almoço e assim pomos a conversa em dia.
Ela - Ok. Eu passo na tua casa por volta da uma, então. Pode ser?
Eu - Pode. Vou fazer tortellini de espinafres com cogumelos grelhados...
Ela - Bem, eu contigo nunca mais emagreço. Fazemos antes assim: eu passo em tua casa e levo coisas para fazer uma salada...

5.03.2010

conversa 1507

Ela - Sempre que se diz que um homem e uma mulher são namorados supõe-se que eles têm sexo.
Eu - Sim, supõe-se.
Ela - Mas eu acho que é possível considerar um homem meu namorado antes, muito antes até, de ter sexo com ele.
Eu - Possível é capaz de ser... mas não acho que seja assim muito normal.
Ela - Não?
Eu - Não, para ser sincero não.
Ela - Os homens e as mulheres são mesmo muito diferentes.

respostas a perguntas inexistentes (84)

o amor enlatado

Detesto o amor enlatado. Aliás, por definição detesto tudo o que vem enlatado, mas no caso do amor ainda detesto mais. O amor enlatado é aquele que se processa industrialmente e traz corantes e conservantes, exactamente como umas salsichas ou sardinhas em tomate. Abrimos, lambemos e até podemos gostar do sabor. O problema é que nunca há surpresas. É sempre aquilo.
Acho que a Barbie e o Ken são os grandes culpados disto tudo, não só por serem dois bonecos estúpidos mas, lá está, por serem igualmente estúpidos. E não é a estupidez que me chateia, é essa igualdade conceptual. Antes de os lambermos já sabemos ao que sabem, tal e qual como nos produtos enlatados. A Barbie é uma miúda afectada que cresceu a ouvir dos mais velhos que era muito bonita, principalmente nas festas de aniversário para as quais os pais, ambos funcionários públicos razoavelmente instalados, só convidavam os filhos dos casais que consideravam pessoas de bem. O Ken era um puto desses, um gajo horrível e convencido, portanto uma pessoa de bem que tratava os pais por você e não saía de casa quando tinha acne.
Não acredito que algum dia a Barbie se tenha realmente apaixonado pelo Ken ou o Ken pela Barbie. Acho apenas que aceitaram a ideia do amor enlatado. Ele tinha tudo para ser namorado dela e ela dele. Tudo, num contexto meramente mediático, entenda-se. De resto nada, é só isso. Gostava de viver num sítio onde bonecas magras de grandes cabelos loiros viessem com um namorado preto do Bronx ou um totó como o Ken viesse com uma namorada gorda. Mas nunca vêm. A indústria não conhece o poder do Amor.
Hoje sentei-me ao lado de dois adolescentes num bar. Eu só queria beber uma cerveja e não pensar em nada durante alguns minutos, mas acabei a ouvir um casalinho enlatado a gozar com um casalinho não enlatado que nem sequer estava presente. Não tem nada a ver, dizia uma imitação da Barbie cheia de certezas, e ele concordava afirmativamente com a cabeça enquanto completava a tese que explicava porque é que a relação dos outros “não tem nada a ver”. Ela é mais alta do que ele, ele veste-se mal e ela até veste mais ou menos, ela é rural e ele urbano. Tive pena deles mas depois zanguei-me. Mandei-os calar. Eles calaram-se.
Tornei a ter pena deles. Tenho sempre pena do amor processado. Estes putos ainda acham que a base do sucesso para uma relação é ambos serem igualmente bonitos. Nem chega ambos serem bonitos, têm que ser igualmente bonitos. Espero que se casem rapidamente, se chateiem rapidamente e divorciem rapidamente, a ver se aproveitam na vida tudo o que o amor não enlatado tem, e esse tudo é o improviso, é aquilo que não se sabe como vai ser. É que o amor é incompatível com regras e, agora que penso nisso, talvez seja incompatível com este mundo. Não faz mal, mudemos o mundo.