sol
O mundo seria enorme se eu o limitasse ao café do teatro do outro lado da rua, aquele onde às vezes surges luzindo por trás da sombra duma máquina de café.E é tão pequeno, o mundo, quando tu dobras a esquina rasgada por cartazes velhos exibindo ainda sorrisos amarelos, e eu me confino à janela embaciada do quarto da frente. Como esta manhã, em que a noite passada ainda é um cadáver decompondo-se na berma do passeio, ora numa garrafa de whisky vazia ondulando ao vento, ora num suspiro vão da iluminação pública que só agora adormece. Também há um vagabundo sorrindo sentado num contentor do lixo. O lixo é dele. Tu dobraste a esquina, talvez para ir comprar pão, e eu fui desenhando com o olhar os cabos dos postes de electricidade, que me parecem desembocar em lugar nenhum e me pareciam seguir-te os passos. Talvez até uma janela como esta, em que alguém se confina a olhar para o café do teatro em frente.O mundo será enorme, quando algum dia te puseres definitivamente do outro lado da máquina de café, e todo o lixo da rua for meu.
[escrito em agosto de 2005]
9 comentários:
Já reli o teu texto e faz-me lembrar de quando era miúda e inventava histórias para povoarem as casas abandonadas por que passava. Aí o mundo era enorme...do tamanho da minha imaginação!
Carla
carla, ;)
Divination?
Elora, não... não é divination...
Um olhar condicionado na liberdade do pensamento pondo-nos no inverso do que visualizamos.
fatyly, lol! nem eu cheguei aí... ;)
pois é...mas foi o que senti:)
ainda bem, fatyly. ainda bem ... ;)
Gosto muito destes escritos em que o gajo pensa que é artista. :-)
Enviar um comentário