7.18.2007

crónicas da cidade que sopra | coisas que não interessam

Amanhã, no Diário de Aveiro, mais uma crónica da cidade que sopra.

O filme não interessa. Uma mulher senta-se numa cadeira duma sala de cinema vazia enchendo-a de solidão. Poucos minutos antes interrompeu, com uma voz calculadamente branda, um rapaz gordo que varria o chão do lado interior do balcão, pontilhado por inúmeras pipocas que mais pareciam os despojos dum fogo de artifício recente. A festa está a acabar, o dia também, e por isso pediu um bilhete para o filme que começasse a seguir. Ele encostou a vassoura cansada à parede, e nem ligou quando ela caiu provocando um tímido estrépito. Com um ar genuinamente condescendente, perguntou-lhe se era mesmo só um. Que sim, só um, respondeu escondendo os olhos nas próprias mãos que guardavam a quantia certa para o pagamento. Agora senta-se na última fila da última sessão, na última sala dum corredor que parece ser o último da vida de alguém. O filme não interessa

9 comentários:

Chapas disse...

Pode ser um filme da vida de qualquer um......

Anónimo disse...

Cinzenta esta tua crónica, com um peso imenso da solidão!
Está um sol tão bonito que podias roubar um raio para oferecer à protagonista do teu texto.
Carla

Ivar C disse...

yep, chapas...

carla, se lesses tudo, talvez percebesses que até ofereci... :)

Elora disse...

Não gosto de salas vazias.

Ivar C disse...

elorinha, eu até gosto... muito.

Anónimo disse...

Li tudo e se ofereceste esse raio foi tão ténue que não o descortinei. Mas ainda bem que o fizeste.
Carla

Ivar C disse...

lol, carla... quem lê tb escreve, não é? ;)

Fatyly disse...

Hoje depois de receber o texto, imprimi e li-o à beira mar. Quando me sinto aos "s" e não bebo:))) vou até lá e é lá que deixo os meus crocodilos.
Comecei a ler e pensei...que porra até isto ainda vem bater mais o cinzento?. Pousei-o e pus-lhe um montinho de areia para não voar e aquele vento, brisa, olhar fez-me tão bem.
Peguei de novo no teu texto, li-o diversas vezes e foi apenas isto: farta do mesmo bater sonoro de gestos quotidianos isolamo-nos, levitamos sobre o que nos consome mas há sempre um pequeno gesto, um som que nos desperta e faz-nos encarar as mesmas coisas de modo diferente.
Acredita que a minha sala vazia encheu-se de coragem num "lá terá que ser", porque o optimismo e o sorriso nunca os perdi.
Certa ou errada, foi o que senti e já o dei à minha mãe:)))))))))
Desculpa se me expliquei mal!
Parabéns!
Um beijo sincero

Ivar C disse...

fatyly, não te explicaste nada mal... obrigado. :)