4.02.2009

pensamentos catatónicos (172)

Acho que em Portugal se vive uma crise de paixão, de amor, ou sei lá o quê. Os cafés, os transportes e os espaços públicos passaram a ser um exílio desse amor, uma espécie de contentores para deportados sem-papéis. Sem papéis do amor, entenda-se.
Os sem-papéis do amor notam-se bem. Normalmente deixam-se hipnotizar por um sonho triste enquanto mexem o café; no metro ou no comboio fazem viagens sempre a olhar para o chão, como se o Sol fosse um intruso a tentar entrar pelas janelas. Nos bancos de jardim jazem cadáveres de noites sós e embriagadas, com garrafas de vinho vazias e jornais desmembrando-se ao vento.
Os ombros dos transeuntes estão rijos e endurecidos e tocam-se com agressividade à hora de ponta, mas nos olhos de todos vive uma espécie de desilusão. Este país está triste e cansado e o pior é que aceitamos isso como normal.

14 comentários:

Bichana disse...

Excelente post!!

Ivar C disse...

bichana, obrigado, ;)

Mário Montez disse...

Não poderia estar mais de acordo.Infelizmente...

Canuck disse...

A vida deve ser levada nas mãos, para se andar direito. Ao deixar que esse peso assente sobre os ombros, fica-se dobrado. Demasiada gente vive sob o peso excessivo da vida.

Catarina disse...

Este post merecia ser mais aprofundado mas... saíu uma boa fotografia!

Sorriso com nariz :-)

Ivar C disse...

mm, imnfelizmente, sim... :)

canuck, é um bocado isso, sim. :)

catarina, se aprofundar mais acho que me deprimo. :)

Olga disse...

Assino em baixo.

L. K. disse...

A crise de valores passa também pela crise de emoções e sentimentos. Tornou-se tudo descartável e indiferente e começa no respeito pelo próprio: se ele não existe muito dificilmente se pode dar e exigir do outro.

É um dos meus hobbies, sempre foi desde que me lembro, gosto de observar, tentar sentir de onde deriva a insatisfação dos outros, o porquê de insitirem numa fantochada de bens materiais e exibicionismo dos mesmos, para tentar preencher um espaço vazio onde acumulam uma solidão em companhia.
As pessoas tentam disfarçar o seu mau-estar interior mas o olhar, que mais não é do que o espelho da alma, não conseguem adequar ao sorriso que colocam. Sei que não é fácil viver em contacto intimo com o nosso interior, as nossas emoções e sentimentos mas sei que é bem mais dificil ignora-los e viver num faz de conta interminável. Os filhos dessas pessoas já crescem com esse olhar e logo na identificação imagoico-imagética assimilam-no e acomodam-no como intrinseco. Para onde caminhamos quando tem de ser a educadora, a professora, o namorado, marido, o patrão ou colega a narcisarem-nos??

Enquanto puder recuso-me a fazer parte desses grupos, posso sentir-me miseravelmente infeliz mas será sempre por escolhas e inerentes decisões minhas e nunca pelos outros.

"Sê sabiamente egoista." (Dalai Lama)

Ivar C disse...

olga, :)

lizard king, é verdade que se deposita demasiada esperança no consumo de gadgets e merdices do género, como forma de atingir alguma felicidade. O efeito é perverso e uma bola de neve. Acho é que a culpa não é só das opções de cada um. É da forma como estamos politicamente organizados. :)

L. K. disse...

Concordo em absoluto que a politica que rege o nosso país tem a sua quota parte neste processo de despersonalização, mas mais uma vez é flagrante que o povo (sobre)vive na atribuição de culpa externa: a politica existente não vem de agora e a bola de neve começou a formar-se em Abril de 1974, não houve meio termo ou politicas de continuidade, passou-se da repressão à quase anarquia disfarçada de democracia. Importamram-se hábitos da europa mas não se criaram as fundações necessárias à sustentabilidade a longo prazo, viu-se e vê-se o país a desmoronar mas não se arrisca a mudança apoiados em discursos demágogicos de amedrontar o povo, que ouve e ngole sem procurar a outra versão dos factos. As pessoas não conseguem perceber e assimilar que estando o estado da nação tão decrépito pior é impossivel e a mudança exige provas e mostras de que se pode fazer algo de diferente, mas no fundo já acredito que o que os assusta é os lobbys que existem passem para outros e não aos mesmos.

E continuo a acreditar que por baixo de tais demagogias é a crise de valores que contribui até para o comodismo a que se assiste. O português acredita que ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão...e o estado Português confirma-o: gerente do BPN simula suicidio e foge do país, deu umm desfalque de 2,5 milhões de euros retirados da conta de 6 clientes. BPN decidiu não apresentar queixa (?!?)

Ivar C disse...

lizard king, quando me refiro à forma como nos ornaizamos politicamente, não estou a falar de Portugal nem do governo português. O governo português é só uma instituição que aderiu a essa forma de organização política. Estou a falar do modelo de (sobre)produção global (desde a China e Bangladesh a Angola e Ocidente), da lógica dos mercados finceiros, do Grupo Bilderberg, do neoliberalismo do Milton Friedman e sucedâneo, etc. :)

calamity disse...

vou roubar.
beijos

Ivar C disse...

calamity, rouba. :)

Cristina disse...

Nem eu diria melhor!
Este país não está cansado, está conformado e habituado ao seu estado de espírito permanente: desistencia! Todos se queixam e ninguém faz nada. Este é o povo portugues!