a unidade
A lógica do mercado não se coaduna com pessoas sós. Nas grandes superfícies são muitos os produtos embalados de forma a que não se possa comprar apenas uma unidade. Acontece na alimentação e em muitos consumíveis. Às vezes não consigo, por exemplo, comprar apenas duas cebolas, dois alhos ou dois pães. Vem tudo embalado como se tudo fosse comprado por famílias. Também é difícil comprar, por exemplo, apenas uma esferográfica das mais baratas, um copo de vinho ou pacote de bolacha Maria. Quando é possível fazê-lo o preço aumenta substancialmente.
Uma pessoa que vive só acaba por desperdiçar parte do que compra. Não são raras as vezes que reparo que tenho no frigorífico um pacote de manteiga fora do prazo de validade, uma cebola já negra ou uma batata grelada.
A viver sozinho aprendi a conseguir pensar. Não estou a dizer que sou mais inteligente do que era antes ou que possuo mais faculdades intelectuais do que quem quer que seja. Estou a dizer que aprendi a gerir o tempo e ganhei uma percepção mais pormenorizada do que se passa à minha volta. Só porque tenho tempo e disponibilidade mental para isso, mais nada. Quase não ligo a televisão e quando o faço, nunca é para ver entretenimento de pacotilha; deixei de saber para quando foi adiado um Sporting-Benfica e, às vezes, só sei o resultado uns dias depois. No entanto já consigo sorrir aos que me agridem verbalmente na estrada; já acompanho todos os pedidos de café com um "por favor" genuíno; já deixo a porta do prédio aberta quando vejo que a minha vizinha está a estacionar o automóvel. Até já dei por mim a apanhar lixo no meio da rua para colocar num ecoponto.
Não descarto a possibilidade de vir a ter de novo uma companheira para a vida, mas se o tiver quero manter esta espécie de disponibilidade para o mundo e para mim, assim como permitir-lhe a ela que a tenha. Podemos ser dois, sim, mas a unidade também é importante, tanto na assunção da nossa individualidade como na compra duma única cebola. Acho que a competição mercantilista está a tentar acabar com isto.
14 comentários:
Tantas alterações...
Eu só aprendi que a roupa não nasce no roupeiro por artes mágicas e também que não há metade das gajas interessadas em mim que ela dizia que havia...enfim.
;)
Fora de gozo, tocaste nalguns pontos que nunca tinha pensado...bem visto, e real! :)
É bom ver que o divórcio, esse bicho-papão da sociedade, gera terreno fértil onde crescem pessoas.
Gostei muito, tanto!, deste teu texto *
A unidade faz a força não é??? Ou será a húmidade??? :)
Abreijinhos
the lost bum, essa das gajas também percebo. enquanto fui casado a minha ex só via mulheres a olhar para mim. entretanto desapareceram... lol
mariana, atenção, isto não quer dizer que não me apeteça dar uma sova nos sacanas dos putos que atiram bolas de ténis à janela do meu escritório. :)
afrodite, acho que é mais as sopas de cavalo cansado. :)
Deixa lá, pode ser que se acertares em algum eles desistam! E crescer pode ser só por partes, não tens de crescer todo. Convém ficar um lado não tão crescido, acrescenta variedade :)
exacto mariana, e assim posso continuar a jogar football manager. :)
Bah! Championship manager é que é!
Blhacccckkk Warcraft, Diablo, Age of Empires é que é :)
mariana, lol, eu só jogo civ 4. :)
afrodite, civilization 4 :)
Gostei de que li!
*
katynha, :)
Não é fácil ter tempo para a comunhão e para a individualidade, sobretudo com crianças... Mas, se se conseguir isso tudo maravilha e parabéns.
eclair, às vezes é mais fácil do que possa parecer à primeira vista.:)
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