respostas a perguntas inexistentes (148)
os cinco sentidos
Sou contra as máquinas fotográficas digitais. Prefiro as outras, as químicas, aquelas em que é preciso meter um rolo que dá para tirar vinte e quatro ou trinta e seis fotografias e, depois de as tirar, ainda é preciso revelar e imprimir em papel para poder ver as imagens.
Contra mim falo, que também substituí o rolo por uma Nikon Coolpix não sei quantos e agora, quando ando com ela, tiro fotografias a tudo e a todos sem saber porquê. O que eu perdi foi a sensibilidade de escolher um momento e um enquadramento únicos. Todos os momentos agora são banais, pelo menos para quem levanta a mão e faz clic com uma mão enquanto come uma sande de fiambre com a outra. Mas isso nem é o mais grave. O pior é não haver um espaço de intervalo entre a visualização da fotografia que se tira e o momento em que se a tira. Qual é a piada de estar a olhar para uma foto de um castelo quando ainda se está dentro do castelo? Nenhuma. Pois é.
Esta semana recebi o telefonema de uma amiga que esteve recentemente na Tailândia. Tens que vir ver as fotos que tirei, disse ela. E eu fui, com uma garrafa de vinho na mão para regar a sessão. Devia ter levado um garrafão de cinco litros porque as fotografias nunca mais acabavam. Eram mais de mil e nem sequer tive tempo para a ouvir falar desses dias. Dantes, numa viagem de uma semana, tirar-se-ia no máximo umas cento e oitenta fotografias, o correspondente a cinco rolos de trinta e seis, e depois sobrava tempo para uma conversa, para ouvir um cd de música local e para provar uma amostra de queijo da região visitada. Desta vez fiquei-me pela violação dos meus olhos com uma enorme quantidade de imagens desinteressantes. Disse-lhe isso com um bocejo e não vi tudo até ao fim. Salvo pela honestidade, portanto.
A overdose de imagens que a Ana trouxe da Tailândia explica-se duma forma muito simples. É pelos olhos que nos apaixonamos, por isso é pelos olhos que tentamos registar a vida. Esse é o problema do olhar. Podemos apaixonar-nos através dele mas não conseguimos Amar através dele. O Amor é também um som, um cheiro, um sabor e uma textura. É esse o registo analógico da vida no Amor e é por isso que até podemos Amar às escuras.
14 comentários:
O que é um sentido sem os outros? Nada! :)
Muito bom!
Concordo plenamente com a última parte sobre o amor... ;)
malena, népias... :)
mushroom, obrigado. :)
A parte do fim está doutro mundo.
É que toda a gente sabe disso, mas mesmo assim tende em continuar a pretender ser enganada pelo que os olhos vêm. É mais bonito, deve ser melhor xD
cota, sim... ouve-se muitas vezes um homem dizer que uma mulher é bonita mas quase nunca se ouve um homem dizer que uma mulher cheira bem, que é suave ou que tem uma voz encantadora. :)
Isso é logo apelidado de choninhas, mas olha que é tanto por homens com mulheres... Estranho
cota, mais do que estranho, eu acho que é um síndrome. :)
Já somos dois e eu não tenho qualquer máquina fotográfica e quando me poem a ver "N" fotos...fico zonza e sem qualquer interesse. É a guerra que tenho: oh pá mandem-me lá uma foto actualizada da "tribo", porque ficam nas máquinas ou pcs deles e adeus fotos.
Claro que concordo com tudo e sobretudo com a parte final deste magnífico post!
Muito bem visto!!
Eu sou daquelas que tira 200 fotos (digitais, pois claro) em cada dia de férias além fronteiras... Um abuso!
fatyly, obrigado. :)
miss b-beautifull, pois... eu também. :)
post genial!!
'É pelos olhos que nos apaixonamos, por isso é pelos olhos que tentamos registar a vida. Esse é o problema do olhar. Podemos apaixonar-nos através dele mas não conseguimos Amar através dele. O Amor é também um som, um cheiro, um sabor e uma textura. É esse o registo analógico da vida no Amor e é por isso que até podemos Amar às escuras.'
:)
carla, :)
Ora Parabens por este belissimo texto :)
Caramba, que eu já nao vinha a este blog fazia meses, assim como deixei de lado o meu blog..
Mas chegar aqui e ler este magnifico texto,deixou-me com uma lágrima no canto do olho, eu confesso.. sou apaixonada pela fotografia analogica há algum tempo :) e terminar o texto da forma como tu o fizeste, relaciona-lo com o Amor foi qualquer coisa..
Acho que o vou roubar com os devidos créditos para o meu blog, com a devida autorização!
inmyplaceblog, obrigado. :)
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