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Nunca morri num sonho
Nunca morri num sonho. Não sei se se passa o mesmo com todos os outros, mas sempre que estou a sonhar, ou melhor, a ter um pesadelo e chego a uma situação em que a minha morte é eminente, acordo uma fracção de segundo antes de morrer e já não morro. Às vezes abro imediatamente os olhos e percebo que estive a sonhar, outras vezes tenho o corpo inundado pelo meu próprio suor e passo algum tempo numa espécie de limbo, em que não sei bem onde estou.
O que eu sei é que nunca morri num sonho.
Uma destas noites estive com um amigo e uma amiga que são, vá lá, pelo menos um bocadinho misteriosos. Acreditam no ocultismo, na existência de espíritos maus e bons e em mais uma série de coisas que eu nem sei identificar. Eu não acredito em absolutamente nada disso, de tal forma que eles ficaram a falar a dois e eu apenas a ouvir enquanto bebia uísque.
A certa altura começaram uma discussão sobre pessoas que tiveram, supostamente, experiências de morte, ou seja, pessoas que morreram durante algum tempo e depois regressaram à vida. Foi então que tive este pensamento para mim mesmo e para um copo já quase vazio: nunca morri num sonho.
Sei que já tive algumas quase mortes bastante dolorosas, como ser enterrado vivo, ser esfaqueado por uma faca de cozinha ou cair do trigésimo andar dum prédio. São momentos em que sofro bastante e tenho a noção que vou morrer, mas depois acordo mesmo antes do momento final.
Acordar num momento destes acaba por ser uma enorme sensação de alívio. A última vez que me aconteceu, fiquei tão surpreendido por estar vivo que tive que tocar em várias coisas à minha volta, como os lençóis, o candeeiro da mesa de cabeceira ou o despertador, apenas para ter a certeza que no meu corpo ainda existia vida. Era precisamente numa queda vertiginosa que ia morrer. Acordei quando atingi o chão.
Tornei a servir-me de uísque e contei isto aos dois, até para que não pudessem dizer que eu tinha passado a noite toda calado que nem um rato, que não gosto de fazer apenas figura de corpo presente quando estou entre amigos. A Sandra fez silêncio e, para meu espanto, ficou a pensar no que eu lhe tinha dito. Acabou por concluir que o mesmo se passa com ela: nunca morreu num sonho.
Apesar desta certeza, a verdade é que raramente me consigo lembrar dum sonho do princípio ao fim. Mal acordo, ele torna-se tão pouco presente como uma qualquer memória de infância. A única coisa que guardo são esses momentos de pânico, mesmo antes de morrer e, portanto, de acordar.
Ficámos a falar a noite toda sobre este aparente contra-senso, que é conseguir acordar depois de morrer, e encontrámos várias metáforas da vida em que é possível fazê-lo. No Amor, por exemplo, quantos vezes acordamos depois de morrer? Aí, já nós os três o tínhamos feito.
Estava agora aqui a tomar café e a pensar como é bom ter amigos com quem consigo conversar assim, de forma desprendida e em que nos compreendemos tanto nos debates terra a terra como em contextos mais absurdos.
- É um sonho! - disse ela.
E eu nunca morri num sonho.
Nunca morri num sonho. Não sei se se passa o mesmo com todos os outros, mas sempre que estou a sonhar, ou melhor, a ter um pesadelo e chego a uma situação em que a minha morte é eminente, acordo uma fracção de segundo antes de morrer e já não morro. Às vezes abro imediatamente os olhos e percebo que estive a sonhar, outras vezes tenho o corpo inundado pelo meu próprio suor e passo algum tempo numa espécie de limbo, em que não sei bem onde estou.
O que eu sei é que nunca morri num sonho.
Uma destas noites estive com um amigo e uma amiga que são, vá lá, pelo menos um bocadinho misteriosos. Acreditam no ocultismo, na existência de espíritos maus e bons e em mais uma série de coisas que eu nem sei identificar. Eu não acredito em absolutamente nada disso, de tal forma que eles ficaram a falar a dois e eu apenas a ouvir enquanto bebia uísque.
A certa altura começaram uma discussão sobre pessoas que tiveram, supostamente, experiências de morte, ou seja, pessoas que morreram durante algum tempo e depois regressaram à vida. Foi então que tive este pensamento para mim mesmo e para um copo já quase vazio: nunca morri num sonho.
Sei que já tive algumas quase mortes bastante dolorosas, como ser enterrado vivo, ser esfaqueado por uma faca de cozinha ou cair do trigésimo andar dum prédio. São momentos em que sofro bastante e tenho a noção que vou morrer, mas depois acordo mesmo antes do momento final.
Acordar num momento destes acaba por ser uma enorme sensação de alívio. A última vez que me aconteceu, fiquei tão surpreendido por estar vivo que tive que tocar em várias coisas à minha volta, como os lençóis, o candeeiro da mesa de cabeceira ou o despertador, apenas para ter a certeza que no meu corpo ainda existia vida. Era precisamente numa queda vertiginosa que ia morrer. Acordei quando atingi o chão.
Tornei a servir-me de uísque e contei isto aos dois, até para que não pudessem dizer que eu tinha passado a noite toda calado que nem um rato, que não gosto de fazer apenas figura de corpo presente quando estou entre amigos. A Sandra fez silêncio e, para meu espanto, ficou a pensar no que eu lhe tinha dito. Acabou por concluir que o mesmo se passa com ela: nunca morreu num sonho.
Apesar desta certeza, a verdade é que raramente me consigo lembrar dum sonho do princípio ao fim. Mal acordo, ele torna-se tão pouco presente como uma qualquer memória de infância. A única coisa que guardo são esses momentos de pânico, mesmo antes de morrer e, portanto, de acordar.
Ficámos a falar a noite toda sobre este aparente contra-senso, que é conseguir acordar depois de morrer, e encontrámos várias metáforas da vida em que é possível fazê-lo. No Amor, por exemplo, quantos vezes acordamos depois de morrer? Aí, já nós os três o tínhamos feito.
Estava agora aqui a tomar café e a pensar como é bom ter amigos com quem consigo conversar assim, de forma desprendida e em que nos compreendemos tanto nos debates terra a terra como em contextos mais absurdos.
- É um sonho! - disse ela.
E eu nunca morri num sonho.
19 comentários:
Que texto brutal!
Adorei.
E é engraçado mas eu acho que comigo também nunca aconteceu.
Gosto de conversas ... sobretudo dessas assim vindas do nada! :D
eva maria, obrigado por me compreenderes. :)
Tenho a sensação de já ter morrido num sonho, mas como eu dou conta que estou a sonhar no meu próprio sonho, devo ter-me apercebido que não poderia ser real! LOL :) Sou mesmo uma parva, nem sonhar sei! Ahahahah
Eu já, mais do que uma vez e na maior parte das vezes foi fixe porque havia um outro lado e até era interessante :)
Faz sentido Bagaço, o espirito nunca morre e é tão interessante este post, cheguei a várias conclusões uma delas é que mesmo em sonho se morresses nunca poderias voltar à realidade para descrever a morte, já que um morto depois de morto nada mais diz ou sente. E se eu continuasse a escrever iria divagar ao mundo da espiritualidade, da dualidade, do paralelismo.
"em sonhos, é sabido, não se morre / aliás, essa é a única vantagem"
;)
Conversas com os amigos servem mesmo para falar de tudo, inclusivé de temas que seriam ridículos para outras pessoas. E eu adoro! :)
A.
Também nunca morri num sonho, mas já sonhei que quase morria. E de uma forma muito poetica. Estava a no inicio de uma ponte, e sabia que, se atravessasse a ponte,não regresaria. Escolhi não atravessar, Acordei surpreendido com toda a carga simbolica!
EJSantos.
well...por acaso sabes o que são sonhos lúcidos? e o que dizer sobre a função do sonho? os ratos que não sonham, estão experimentalmente condicionados a não entrar em estado REM de sono, deixam de ter comportamentos instintivos sobre comportamentos de segurança, e mais ainda sobre função do sonho, lúcido ou não, na estabilidade emocional do ser humano (:
p.s.: nunca fiz a experiência dos sonhos lúcidos, but its on my to do list...
eli, como é que se dá conta que se está a sonhar no próprio sonho? Nunca me aconteceu tal coisa. :)
redonda, gostava que isso me tivesse acontecido... :)
carmo, sou existencialista. o espírito depende do corpo para ter existência... e daqui não saio. :)
menino de sua mãe, há aqui quem tenha morrido. :)
a., também eu... é do melhor que me pode acontecer. :)
ejsantos, mas encontraste uma metáfora concreta? Isso parece-me interessante. :)
$hort, não sei nada disso, mas de repente apetece-me ir investigar. :)
TAL E QUAL ;)
quase nos "entas", :)
Pois, a mim acontece-me às vezes... é uma "parvoíce" eu sei! ahahahah Mas, olha que é verdade!!!
Tenho sonhos/ pesadelos muito vívidos e marcantes, mas também nunca morri num sonho...
Lembro-me de tudo quando acordo como se tivesse vivido a situação um dia antes, embora a ligação entre as pessoas e os espaços nem sempre seja compreensível.
Mas depois, passado umas horas não me consigo lembrar de quase nada. Mas os sonhos impressionam-me porque não sonho sempre, mas quando sonho é muito cansativo.
Gostei dessa ideia "nunca morri num sonho". Será que há alguém que já tenha morrido?
eli, não é uma parvoíce. é um sonho. :)
t., parece que sim, que há quem tenha morrido. :)
Todos sonhamos como deves saber, mas nem todos se lembram dos mesmos.
Em miúda tinha pesadelos e há anos e anos que nunca tive mais nenhum, nem nunca sonhei com mortos, nem quedas.
Dos poucos que me lembro são quase sempre de uma tranquilidade incrível com a natureza e imensamente coloridos. Chego a acordar e a retomar o sonho...
Também tenho amigos que acreditam no que referes, eu não acredito porque sou mais "ver para crer" e adoro falar com eles porque é sempre agradável...agora fanáticas(os) absurdos...fujo deles:)
fatyly, podem ser surreais, essas conversas. por isso é que são giras. :)
isso lembra-me o Incepcion. agora deste-me vontade de ir ver um filme.
super sónia, vou ver também, então. :)
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