7.10.2008

a culpa é nossa

A culpa da morte de mais catorze imigrantes ilegais (incluindo nove crianças) que tentaram chegar ao sul de Espanha é nossa. A Europa e os Estados Unidos estão a matar à fome o continente africano através duma lógica de mercado unilateral. O aumento do preço dos alimentos, que se faz sentir muito mais nos países pobres, tem como causa principal a política ocidental dos biocombustíveis, que desviou cereais destinados à alimentação para a produção de combustíveis.
Numa economia "livre" a especulação sobre bens que escasseiam é imediata, e os mais fracos pagam imediatamente a factura. A maior parte das pessoas com que falo diz-me que não se interessa por política, sem perceber que esse desinteresse que demonstra com tanto orgulho mata todos os dias alguém.

24 comentários:

Pax disse...

Eu acredito que o problema aqui nem é só do exterior desses países. É lá dentro que está o principal mal.
A riqueza de alguns é muito mais chocante quando nos lembramos da pobreza de tantos outros. Que essa riqueza seja proporcionada pelo exterior também é verdade.

Já vi bastante (pessoalmente) deste tipo de tentativas de fuga. Já vi coisas que só mesmo vendo se consegue acreditar. O desespero extremo leva a este tipo de suicidios. Sabem que não têm nada a perder.
A vida, se ficarem, sabem que a perderão na mesma.

Ivar C disse...

pax, o "interior" desses países que, tens razão, é normalmente politicamente corrupto, é suportado pelos governos ocidentais para que depois seja possível fazer cimeiras europa-áfrica como a de Lisboa, em que se fomenta a livre circulação de mercadorias e se retrai a circulação de pessoas. A livre circulação de mercadorias serve para isto mesmo: para que um europeu tenha biocombustível e um marroquino, por exemplo, não tenha que comer. :)

Pax disse...

O marroquino não deveria ter necessiadade de sair de Marrocos para ter o que comer! Isso seria o ideal. É um país riquissimo em muitissimas coisas: Terras incrivelmente ferteis, longa costa de mar (Mediterraneo e Atlantico) potencial turistico imenso, etc, etc.
O mal é que tudo isso está dominado por meia duzia de familias enquanto o resto do país morre de fome.
Marrocos não precisaria dos EUA nem da Europa para ser um país com justiça social. Precisaria, sim, do mais dificil: outra mentalidade.

Paula disse...

ainda hoje nas notícias da rádio vinha a ouvir a ementa de uma reunião que se realizou no japão para discutirem o combate à fome...
foi "hilariante" ouvir a aberração do que eles comeram e beberam para discutir o assunto...
o mundo está virado de pernas para o ar e não é de agora....

Anónimo disse...

Impressiona-me o desespero a que as pessoas têm de chegar para conseguirem alcançar apenas uma necessidade básica que é terem um bocado de pão para comer.
Em Portugal ainda se morre de fome, no entanto continuamos a ignorar questões nacionais que são tão ou mais graves que esta: o endividamento constante, a escalada do preço dos alimentos, problemas sociais graves como a integração de pessoas com dificuldades...
E, no entanto, nada disso importa quando há futebol.
Não nos mobilizamos para nada (excepto se falarmos de camionistas)
Somos passivos e acomodados.
E isso irrita-me profundamente. :S

Anónimo disse...

Acerca dos bio-combustíveis existe aquela notícia acerca da Junta de Freguesia da Ericeira que, por passar a utilizar biodiesel nos veículos da Junta teve de pagar uma multa brutal por não estar a enriquecer o estado com a compra de combustíveis convencionais.
Se não fosse tão injusto e chocante até podia ser anedota...

Ivar C disse...

pax, eu disse marroquino como um mero exemplo, estava a falar do Magrebe e de todos os países do Saara.
De resto tens razão, o ideal seria não ter que sair de Marrocos para ter o que comer. O que te estou a dizer é que essa meia dúzia de famílias nõ é importante quando comparada com o grupo Bilderberg, A Europa ou os EUA, que as controlam. Se mudares o regime político marroquino as coisas vão continuar na mesma, assim como continuam no resto daquele continente.
A base da economia dos países africanos é a agricultura (em Marrocos também) mais alguma indústria a que eles chamam transformadora mas às vezes não é bem. O que acontece é que essa agricultura é controlada por empresas europeias e americanas, não por africanos.
Acreditar que a política marroquina podia fugir à lógica de mercado é perigoso. Não pode, a não ser que isso parta precisamente dos que a controlam. nós. :)

paula, já passei pelo mesmo, a nível local e internacional. já vi jantares em hotéis de grupos tipo Lions clube, onde se gastam balúrdios para depois oferecer uma cadeira de rodas a um triste qualquer. :)

ana, tens razão,sim. essa notícia de que falas é tão triste quanto ridícula, porque uma Junta de Freguesia é um órgão de Estado. :)

Pax disse...

Também só falei em Marrocos porque é o caso que melhor conheço. Conheço as pessoas e a forma como vivem.
Os motivos politicos por trás disso... nem por isso.
:( Mas já vi o suficiente para poder tirar algumas conclusões.

Ivar C disse...

pax, a política pode controlar a economia e, neste caso é a economia (global e não a de Marrocos) que tem que mudar. :)

Pax disse...

Acredito que sim. Mas a mentalidade lá dentro, se mudasse, ajudava muito.

Ivar C disse...

pax, isso é verdade. lá dentro e em todo o mundo. :)

Olga disse...

É verdade que há um grande desinteresse pela política e eu própria confesso que sou uma dessas pessoas desinteressadas. Mas não me orgulho disso. Acho que o desinteresse geral vem do sentimento de incapacidade e de descrédito quando se pensa em fazer alguma coisa para tentar mudar o mundo. E o ser humano só muda de mentalidade quando bate com a cabeça e sofre na pele. Já não vai lá com palavras.

ComoHacerElAmor disse...

Todos os dias more uma persoa , cada noite nace uma esperança...

pe disse...

tens razão.
isto é, no mínimo, nojento.
...

Ivar C disse...

alexandre,

Tens razão. Eu vejo as coisas a preto e branco. Tu só vês a branco. O que é que isto quer dizer? Nada. Portanto, por favor, evita frases que só por si não queiram dizer nada.
Não te vou falar de apoio nenhum do Ocidente, e nem sequer percebo porque é que estás a dizer isso. A conclusão a que chego é que tu achas que a corrupção em África não tem o dedo da Europa e dos EUA, o que é manifestamente falso. A tentativa da influência política da França na África Central é tão óbvia, por exemplo, que só não vê que não quer. Mas eu acho que nem é esse o teu problema. O teu problema é que falas em Eles e Nós como se fossemos isso mesmo, e não somos. A corrupção existe em África porque dá jeito ao Ocidente que assim seja, na base do modelo da economia de mercado. Quem explora o terreno arável em África são empresas multinacionais europeiaa e americanas, e essas é que corrompem o poder político.
Agora, deixa-te de patetices. Quem pega num barco de merda e atrevessa um oceano, não é por causa de censura política, É PORQUE TEM FOME, e tem fome por causa dessas multinacionais, ou seja, tem fome por nossa causa. Porque este modelo de sociedade a que chamas ainda imperfeito mas melhor, é um modelo que vive a parasitar os outros povos.
Quanto ao facto de achares que alguns que falam mal desta sociedade não fazem nada, olha, eu faço. Tento ter um papel político o mais activo possível, escrevo para jornais quando posso e, por exemplo, até neste blogue falo de política. A ti é que não me lembro de ver nada...

olga, eu acho que normalmente é mesmo egoísmo. enquanto vivermos mais ou menos, os outros n interessam. :)

comohacerelamor, :)

pe, é nojento... por isso é que é preciso que mude. :)

José Teixeira disse...

A culpa é nossa, concordo contigo sem reservas.
Deitar culpas aos regimes africanos é a forma fácil de nos desculparmos da porcaria que fazemos há séculos. Basta querer saber o que o ocidente tem feito em África nos últimos 200 anos para se perceber que a relação é desigual diria mesmo obscena. Retirar a matéria prima de que precisamos, o minério, os cereais ou o peixe deixando lá um valor muito abaixo do real é só parte da sangria que nós todos, os ocidentais, temos feito.
Fechar as portas a quem nos pede trabalho para poder comer é um crime ainda maior, muito maior se pensarmos porque têm de pedir.
Só uma última nota de relativo apreço para o governo espanhol que consegue gerir esta situação com um mínimo de dignidade para todos.
O "eles" e "nós" a que se refere não sei quem são.

Ivar C disse...

japinho, os últimos duzentos anos numa lógica industrial porque na prática, foram seiscentos anos a lixar os gajos. é por isso que discursos como o do Alexandre revelam um ignorância atroz. :)

SP disse...

"dá(êm)-me um exemplo de sociedade que fora do espectro "ocidental" que conhecemos, seja melhor, mais justa e mais equitativa?"

Eu posso fazer isso... Aliás, posso até indicar-te uma que existiu à milhares de anos atrás, e que NUNCA mais houve uma que lhe chegasse aos calcanhares.
Chama-se Egipto. Não o actual. O antigo.
Era a sociedade mais culta da época, era pacífica, tratavam as mulheres como princesas, não havia corrupção, os escravos eram reféns de guerra, mas eram remunerados e viviam muito melhor que as classes pobres de outras sociedades, além de poderem comprar a liberdade.
Tinham faraós? Sim, mas ainda hoje há reis (e sempre é melhor resi que ditadores). E afnal, alguém tinha que mandar.
Tinham religião? Sim, mais ainda hoje o mundo está cheio dessa catástrofe. E pelo menos a deles incitava a viver a vida na sua plenitude, não como as actuais, que só querem é dinheiro e obedieência cega.

Ivar C disse...

13, mas a resposta a essa pergunta, que eu acho tão primária que nem ia responder, é que se nós andamos a lixar os africanos há séculos, somos melhores em quê? em nada... :)

L.T. disse...

até onde me consta, desde sempre os africanos fazem essa travessia, assim como os brasileiros atravessam o méxico ou coisa assim e o preço dos alimentos continuava a ser o mesmo.
essa fuga é uma questão própria da áfrica que praticamente nada tem a ver com qualquer alta no preço dos alimentos.

Ivar C disse...

luciana teixeira, esta alta no preço dos alimentos é só um exemplo de como África é o continente que fica sempre a perder. De resto a fuga não é própria de África, é própria de qualquer pessoa que não tem que comer, é própria de qualquer pessoa que tem (e sempre teve) alimentos demasiado caros para o poder de compra e com escassez.
Só gostava que me explicasses como é que desde sempre os africanos fazem essa travessia. Se não fosse grave, essa afirmação dava para rir. Desde sempre que os africanos adoram meter-se num barquito de pesca, com crianças e tudo, e atravessar um oceano, mesmo que metade morra à fome e sede e outra metade chegue doente. Uau, alto desporto.

Ivar C disse...

Alexandre,
1)a blogosfera é um espaço democrático. Tu podes abrir um blogue teu e escrever lá o que quiseres. 2)Não percebi essa da máscara. Podes dizer o que te apetecer sem levantar suspeitas enfadonhas primeiro. 3) Tu não puseste questão nenhuma. Limitas-te a dize meia dúzia de palermices baseadas na tua experiência. 5)As alternativas passam por um modelo económico socialista, sem sobre produção capitalista e sem exploração de matéria primas alheias.

Anónimo disse...

Não querem todos juntar-se para jogar ao Fair Play comprado numa loja do Comércio Justo? ;) Pode ser que no fim até conseguissemos ver algums alternativas e tentar fazer com que todas as cadeias se tornassem mais justas.. :)

Beijitos,
Mary

Ivar C disse...

mary, infelizmente há poucas lojas de comércio justo. em aveiro , por exemplo, não há nenhuma. :)