pensamentos catatónicos (275)
Balotelli
No trabalho devemos ser tristes. O trabalho é um dever de todos, durante o qual devemos sofrer e evitar qualquer manifestação de felicidade. Só a sofrer justificamos o pão de cada dia. É evidente que eu discordo totalmente deste princípio judaico-cristão, transposto estrategicamente para o modelo económico capitalista após a separação dos poderes político e religioso. Por isso mesmo é que fiquei estupefacto quando, durante o Euro 2012, vi tantas pessoas (incluindo amigos meus) elogiarem o Balotelli.
Eu nem sequer sabia quem era o Balotelli, mas fiquei a saber que é um jogador que não costuma festejar os seus próprios golos porque acha que eles fazem parte do seu trabalho. Para o demonstrar, comparou os seus golos com um carteiro a entregar uma carta. Ele não festeja, pois não? Perguntou.
Pois não, mas devia festejar. Era bom que todos pudéssemos festejar o nosso trabalho todos os dias, por nos sentirmos recompensados económica e socialmente com ele. Era bom que todos percebêssemos que devemos estar gratos a quem entrega uma carta, a quem entrega uma pizza ou a quem varre as nossas ruas.
Festejamos os golos do Balotelli sem perceber que, ao fazê-lo, estamos a contribuir para uma felicidade efémera e para uma infelicidade continuada. A do trabalho, a dos dias que passam.
A esse propósito, recebi hoje um postal que Raquel me enviou a semana passada durante uma visita que fez a um país estrangeiro. Entre outras coisas diz que ali, onde ela estava, só lhe faltava eu para se sentir feliz. Agradeci ao carteiro ter-mo trazido direitinho à minha caixa de correio. Para mim, ele é mais importante que qualquer jogador de futebol.
No trabalho devemos ser tristes. O trabalho é um dever de todos, durante o qual devemos sofrer e evitar qualquer manifestação de felicidade. Só a sofrer justificamos o pão de cada dia. É evidente que eu discordo totalmente deste princípio judaico-cristão, transposto estrategicamente para o modelo económico capitalista após a separação dos poderes político e religioso. Por isso mesmo é que fiquei estupefacto quando, durante o Euro 2012, vi tantas pessoas (incluindo amigos meus) elogiarem o Balotelli.
Eu nem sequer sabia quem era o Balotelli, mas fiquei a saber que é um jogador que não costuma festejar os seus próprios golos porque acha que eles fazem parte do seu trabalho. Para o demonstrar, comparou os seus golos com um carteiro a entregar uma carta. Ele não festeja, pois não? Perguntou.
Pois não, mas devia festejar. Era bom que todos pudéssemos festejar o nosso trabalho todos os dias, por nos sentirmos recompensados económica e socialmente com ele. Era bom que todos percebêssemos que devemos estar gratos a quem entrega uma carta, a quem entrega uma pizza ou a quem varre as nossas ruas.
Festejamos os golos do Balotelli sem perceber que, ao fazê-lo, estamos a contribuir para uma felicidade efémera e para uma infelicidade continuada. A do trabalho, a dos dias que passam.
A esse propósito, recebi hoje um postal que Raquel me enviou a semana passada durante uma visita que fez a um país estrangeiro. Entre outras coisas diz que ali, onde ela estava, só lhe faltava eu para se sentir feliz. Agradeci ao carteiro ter-mo trazido direitinho à minha caixa de correio. Para mim, ele é mais importante que qualquer jogador de futebol.
15 comentários:
Há por aí muitos patrões que infelizmente idolatram esse princípio judaico-cristão.
Sentirmo-nos recompensados economica e socialmente pelo nosso trabalho não implica festejos semelhantes aos praticados pelos jogadores de futebol. Balotelli simplesmente opta por não festejar os golos que marca por considerar que essa é a obrigação dele, mas isso não implica que não se sinta 'feliz' quando marca um golo.
Consigo comparar isso ao trabalho de um cirurgião (muito embora as duas profissões tenham muito pouco ou quase nada em comum): quando uma cirurgia não corre como o esperado é notória a tristeza, quando uma cirurgia corre bem, embora seja algo que traz felicidade e sentimento de dever bem cumprido, não se põem aos saltinhos no meio do bloco.
Quanto ao carteiro, o facto de ele não festejar quando me traz uma carta não implica que eu não lhe esteja grata. Aliás, o facto de as pessoas estarem a fazer o seu trabalho não implica que eu não lhes agradecem de cada vez que o seu trabalho me envolve.
olga, pois há... é um dos principais princípios dos patrões. :)
', se implica festejos ou não, depende de cada um, mas para perceber o que alguém escreve é sempre preciso um mínimo de capacidade de abstracção. Aliás, por acaso o único golo que eu vi do balotelli na televisão, até foi bastante festejado por ele, portanto ele próprio achará que o carteiro poderá faz~e-lo. :)
Assisti ao euro e a quase todos os jogos e conferencias . Para mim essa declaração como tantas outras semelhantes é apenas falsa modéstia..!
(continua a acompanhar o teu blog bem de pertinho sempre apesar de não comentar e continuo a adorar)
Acabei de ler o teu texto com um sorriso sonoro. Obrigada por o teres escrito. Já o festejei. :)
soryta, obrigado pela presença e pela simpatia. provavelmente foi isso mesmo: falsa modéstia. :)
eli, eu festejo quando escrevo. obrigado. :)
Desconhecia esse principio judaico-cristão, credo que coisa mais apalermada.
Estou totalmente de acordo contigo e além do carteiro, varredor-da-rua etc, etc. são e valem muito mais que qualquer jogador de futebol (montras de vaidades)...com uma pequena/GRANDE diferença: trabalham de facto e MUITO e são tão mal remunerados!!!
Gostei!
fatyly, essa é a grande questão, a da remuneração. :)
Para todos os efeitos o trabalho não deixa de ser uma obrigação, mas tem como contrapartida o facto do nosso trabalho contribuir, pelo menos, para a felicidade de outra pessoa...
e achas que consegues resolver? sempre houve, há e haverá diferenças abismais de remunerações...e no nosso país que actualmente está a saque...está cada vez pior...mas não há crise que não acabe,cá se fazem, cá se pagam e depois da tempestade vem sempre a bonança.
Até nós estamos de passagem!
A Vida da Cinderela de Saltos Altos, o trabalho é um direito e um dever, sim. ou devia ser. :)
fatyly, a História das civilizações é feita de pessoas que acham que podem resolver coisas e de pessoas que acham que não vão resolver nada. Cada vez que alguma coisa muda, é por causa de pessoas que acreditam que podem resolver... :)
Agradeces ao carteiro assim como os adeptos agradecem também os golos do Balotelli, pelo mesmo motivo que já referiste: pela felicidade proporcionada, ainda que efémera. Se um é mais importante que outro, honestamente acho que essa avaliação não faz sentido aqui. Nem foi com esse propósito que o Balotelli fez aquela comparação, a meu ver.
amelia, pois... se ele nem estava a falar dos adeptos mas sim dele mesmo... :)
Pra variar, adorei! E nessas horas de pausas no trabalho pra ler os seus textos, fico feliz. E lá foi postado no facebook. Podia?
kelly, obrigado, eu agradeço: :)
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