foi só isso...
Por definição não gosto de galerias de arte. Gosto de arte, todo o tipo de arte, quando de alguma forma ela me emociona. O problema das galerias de arte é exactamente esse: castram a emoção pela raiz. Primeiro enclausuram-na, depois silenciam-na e por fim exibem-na como se fosse uma coisa rara. Não é. A arte, todo o tipo de arte, é-nos natural.
Ainda não estava apaixonado pela Teresa no dia em que fomos ver uma exposição de pintura em Lisboa, dum pintor qualquer de que já nem lembro o nome, mas acreditava que isso me ia acontecer em breve. Ela foi pousando brandamente os olhos dela, de quadro em quadro, e quando andava era como se o som dos seus saltos altos fosse uma espécie de crime. Aligeirou o passo e perguntou-me se eu estava a gostar.
- Mais ou menos... - respondi para não a desiludir totalmente - nenhum dos quadros é figurativo, então nenhum me diz nada.
- Ao menos fala baixo. - pediu ela de forma embaraçada.
Eu saí da galeria e esperei por ela lá fora e, enquanto passeava os meus olhos de forma discreta pelas mulheres que iam passando, decidi-me a não me apaixonar por ela. Às vezes, não Amar pode ser a melhor solução. Pelo menos foi o que eu pensei. A Teresa era bonita, mas também ela era uma espécie de galeria de arte. Nela, às vezes tinha que falar baixinho para não parecer estúpido. Outras vezes vezes era mesmo melhor calar-me.
Nesse mesmo dia inventei uma desculpa qualquer e apanhei o intercidades para Aveiro, onde acabei a noite sozinho a beber Bushmills num bar que também tinha nas paredes uma exposição de pintura. Sem sair da minha cadeira ao balcão, vi os quadros todos. Eram retratos de pessoas que provavelmente nem existiam. A dona do tasco reparou e perguntou-me se eu tinha gostado.
- Sim, todas as pessoas retratadas me parecem serenamente felizes, como se tivessem acabado de passar por uma qualquer contrariedade na vida e agora se sintam calmas e aliviadas.
- Obrigado, vou dizer isso à minha filha. - Ofereceu-me o terceiro copo de uísque, que agradeci.
Nessa noite cheguei à conclusão de que, pelo menos para mim, era melhor que todas as exposições de qualquer tipo de arte fossem em bares e não em galerias. Nas galerias, por norma, não interpretamos sequer o que vemos. Pelo contrário, submetemo-nos totalmente àquilo que é suposto perceber, ou então é melhor fecharmo-nos na nossa esmagadora ignorância.
Eu acredito, e gosto de acreditar, que o ser humano é criativo em praticamente tudo o que faz. A Amar também. O Amor é uma arte como outra qualquer, embora não tenha suporte físico. É como a música, por exemplo, e nesse dia desafinei de propósito para acabar de tocar uma canção que nunca me iria sair bem. Foi só isso.
Ainda não estava apaixonado pela Teresa no dia em que fomos ver uma exposição de pintura em Lisboa, dum pintor qualquer de que já nem lembro o nome, mas acreditava que isso me ia acontecer em breve. Ela foi pousando brandamente os olhos dela, de quadro em quadro, e quando andava era como se o som dos seus saltos altos fosse uma espécie de crime. Aligeirou o passo e perguntou-me se eu estava a gostar.
- Mais ou menos... - respondi para não a desiludir totalmente - nenhum dos quadros é figurativo, então nenhum me diz nada.
- Ao menos fala baixo. - pediu ela de forma embaraçada.
Eu saí da galeria e esperei por ela lá fora e, enquanto passeava os meus olhos de forma discreta pelas mulheres que iam passando, decidi-me a não me apaixonar por ela. Às vezes, não Amar pode ser a melhor solução. Pelo menos foi o que eu pensei. A Teresa era bonita, mas também ela era uma espécie de galeria de arte. Nela, às vezes tinha que falar baixinho para não parecer estúpido. Outras vezes vezes era mesmo melhor calar-me.
Nesse mesmo dia inventei uma desculpa qualquer e apanhei o intercidades para Aveiro, onde acabei a noite sozinho a beber Bushmills num bar que também tinha nas paredes uma exposição de pintura. Sem sair da minha cadeira ao balcão, vi os quadros todos. Eram retratos de pessoas que provavelmente nem existiam. A dona do tasco reparou e perguntou-me se eu tinha gostado.
- Sim, todas as pessoas retratadas me parecem serenamente felizes, como se tivessem acabado de passar por uma qualquer contrariedade na vida e agora se sintam calmas e aliviadas.
- Obrigado, vou dizer isso à minha filha. - Ofereceu-me o terceiro copo de uísque, que agradeci.
Nessa noite cheguei à conclusão de que, pelo menos para mim, era melhor que todas as exposições de qualquer tipo de arte fossem em bares e não em galerias. Nas galerias, por norma, não interpretamos sequer o que vemos. Pelo contrário, submetemo-nos totalmente àquilo que é suposto perceber, ou então é melhor fecharmo-nos na nossa esmagadora ignorância.
Eu acredito, e gosto de acreditar, que o ser humano é criativo em praticamente tudo o que faz. A Amar também. O Amor é uma arte como outra qualquer, embora não tenha suporte físico. É como a música, por exemplo, e nesse dia desafinei de propósito para acabar de tocar uma canção que nunca me iria sair bem. Foi só isso.
20 comentários:
De facto, o ser humano é criativo em tudo o que faz... Por isso é que é tão fascinante...
estadista de algibeira, concordo com isso. até na música que ouvimos, as escolhas são as nossas por algum motivo. :)
Sim também concordo, as galerias de arte são por si só, como hei-de dizer...frias, com focos de luzes impróprios, cheios de rócócós que não lhes dão vida...ao inverso de quando expostas em lugares movimentados, não diria bares mas outros locais.
Nem todos os dias somos criativos...até no Amor!
Este texto achei um pouco contraditório e não sei dizer a razão!
fatyly, :)
tens toda a razão, a arte devia ser livre
timtim, :)
Como eu concordo contigo, caro amigo! Há vezes em que vou a exposições e saio de lá com uma sensação de extra-terrestre. como se algo de errado houvesse (só) comigo porque não 'senti' o que algumas pessoas por lá 'apreciavam' em voz alta. há um bar em Faro, onde costumo ir de vez em quando, que costuma ter quadros nas paredes, (criações de alguns frequentadores), e já vários me 'tocaram' por alguma razão... sabes, acho uma excelente ideia esta da 'malta' expor os trabalhos em lugares assim, talvez por serem menos 'formais'ou algo... gostei! =)
beijo!
memyselfandi, por isso, e porque o uísque ajuda a gostar de alguns trabalhos. :)
Aveiro... sempre uma boa escolha!
Hoje Lisboa, amanha Aveiro!
Gosto...
nunes, para mim, a escolha é Lisboa (também boa). Aveiro é-me natural. :)
Acho que nas galerias sobrevalorizam demais o que lá está, como se fosse algo divino vindo lá de cima ou lá de baixo. As pessoas valorizam as coisas por estarem na galeria, acham fantástico e consideram artístico tudo que se encontra lá. Podem estar erradas ou não. Considero arte tudo aquilo que me causa calafrios ou que chama de imediato a minha atenção. Fui uma vez ao CCB ver uma exposição, quando saí de lá só tinha gostado de um quadro. Tudo o resto pareciam-me demasiado vulgar e sobrevalorizado.
'desafinei de propósito para acabar de tocar uma canção que nunca me iria sair bem' tivesse eu tido a mesma coragem e a mesma lucidez...
elle talis, é o que eu acho... :)
maria madeira, nem é bem coragem... :)
"- Sim, todas as pessoas retratadas me parecem serenamente felizes, como se tivessem acabado de passar por uma qualquer contrariedade na vida e agora se sintam calmas e aliviadas.
- Obrigado, vou dizer isso à minha filha. - Ofereceu-me o terceiro copo de uísque, que agradeci."
Gostei da parte do uísque. Provavelmente por causa dele as pessoas retratadas estavam com um aspecto sereno! :-)
Há uns anos atrás, uma amiga minha estava a visitar uma exposição de arte moderna em Amsterdam. Sentindo-se desconfortável, descalçou os sapatos e colocou-os em cima de uma cadeira. E esqueceu-se deles! Quando se lembrou que lhe faltavam os sapatos, voltou ao sitio aondo os tinha deixado. Encontrou um grupo de pessoas, com ar muito intelectualoide, espectados em frente à cadeira, a olhar para os sapatos.
Hmm, perfeita metafora! :-)
EJsantos
Inclusive, tem galeria com um olhar já pronto, sem intervalo ou liberdade. Tudo dito.
Abraço do Pedra do Sertão
Bingo, para a analogia. Gostei, Bushmils à parte :)
Gosto da história, da abordagem, sempre quente, mas não concordo com esta frase:
"O Amor é uma arte como outra qualquer, embora não tenha suporte físico."
ejsantos, lol. tenho que fazer isso dos sapatos. :)
pedra do sertão, exactamente. :)
brisa, obrigado :)
eli, na boa, até porque há coisas que não são para concordar ou deixar de concordar. :)
Só não concordo com a parte do suporte físico, porque tem. :)
eli, ah! dito assim até sou capaz de estar contigo. :)
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