1.16.2012

pensamentos catatónicos (269)

botas de borracha

Devo dizer que detesto a palavra fashion ou, se preferirem, acho a indústria da moda e as passagens da Fátima Lopes a coisa mais imbecilóide que pode haver. A roupa e o calçado para mim são apenas isso mesmo: roupa e calçado. Ponto
O que eu me lembro de gostar de calçar, quando era a criança, é das botas de borracha que me permitiam saltar para as poças de água sem molhar as meias e os pés. A minha mãe também as adorava, mas porque eram baratas e me calçavam durante toda a  época chuvosa do ano. Lembro-me de percorrer o caminho entre a minha casa e a escola primária com as minhas vermelhas calçadas, saltando de poça em poça de água como um gafanhoto errante.
Para além das crianças, as únicas pessoas que usavam botas de borracha eram os agricultores, exactamente com o mesmo motivo de não molhar as meias nem os pés. A única diferença é que as botas deles eram pretas e as das crianças eram às cores. A Helena, por exemplo, tinha umas azuis de que nunca me esqueci. Lembro-me delas a tentarem pisar as minhas numa brincadeira do recreio.
A Helena foi a minha namorada da infância, ou seja, foi a minha namorada que nunca o chegou a ser. Lembro-me de fugir da escola com ela para andar de baloiço no parque, de dividirmos os nossos lanches pelos dois, de nos sentarmos em cima do ramo duma árvore onde planeávamos construir uma cabana que nunca chegou a existir. Depois os pais dela foram viver para Lisboa e roubaram-na de mim. Nunca mais a vi.
Um destes dias, enquanto passeava com a Raquel, vi umas botas de borracha assim, iguais às que eu e a Helena usávamos em criança. Eram as mesmas, só que em vez de estarem amontoadas numa caixa na velhinha sapataria Lé, em Aveiro, estavam numa prateleira de vidro iluminadas por dois focos como se fossem o actor principal dum filme hollywoodesco qualquer. Custavam mais de cem euros e uma adolescente gritava com a mãe hesitante para que lhas comprasse.
A Raquel disse-me que agora é normal, que as botas de borracha estão na moda e são um produto quase de luxo. Por um momento pensei na Helena e desejo, em nome das memórias da minha infância, que ela não se tenha tornado assim, alguém que anula o sentido prático e divertido da vida para se colocar numa iluminada mas entristecida prateleira de loja, que é o que a palavra fashion nos faz a todos. É por isso que a detesto. Ponto.

27 comentários:

Anónimo disse...

Partilho desse mesmo sentimento, as botas de borracha são para ir às vacas!

Sutra disse...

"assino por baixo" :)

beijo
Sutra

Malena disse...

Chamavamos-lhes galochas! Nome tão pouco "fashion! ;)
Pode ser que a Helena tenha crescido bem... Tem nome de quem cresce bem! ;)

Ivar C disse...

paulo césar, ou para pisar poças de água. :)

sutra, boa. :)

Ivar C disse...

malena, tem nome de quem cresce bem e começou por escolhe muito bem os amigos e namorados. :)

Dexter disse...

Eu recusava-me a ir a escola sempre que a minha mãe me obrigava a usar galochas. Elas simplesmente não compreendem que isso inviabilizava completamente a integração social de um jovem rapaz, porque simplesmente...não se pode jogar à bola com elas! Ou não dá muito jeito, vá.

Para além de ser feio.

Jude disse...

Também tinha umas vermelhas nos meus tempos de escola primária!::)

Sourire * disse...

Eu detestava botas de borracha e mesmo sendo fashion agora, continuo a não gostar.
Bagaço, fizeste-me recordar as minhas botinhas a saltitar na água, eram azuis também, com a sola branca... (feias como tudo, tanto discutia com a minha mãe quando era obrigada a calça-las!)

Perfectly Crazy disse...

O que eu adorava as minhas botas de borracha vermelhas e o meu fato da chuva para ir para a escola! No meu caso, como sou de uma aldeia, as botas de borracha também serviam para o quintal; até para subir à tangerineira eram funcionais.

anouska disse...

Bagaço, podem ser divertidas, praticas e ... fashion! Coisas de mulher, portanto!
Quando era miúda tive umas azuis com olhos e boca, nada fashion. E o que eu gostava delas!

Lily disse...

Também tive umas galochas vermelhas... Bons tempos...Fez-me recordar a altura em que o meu passatempo preferido quando chegava o Outono e ia para a escola, era pisar todas as folhas e ficar imensamente feliz quando elas faziam um barulho "estaladiço e crocante"!

Olga disse...

Engraçado, também tive umas botas de borracha vermelhas quando era criança. Bons tempos esses de liberdade e despreocupação. :)

Anónimo disse...

Antes, eu também achava esse negócio de moda a coisa mais inútil que existia. Pouco me importava a roupa que ia usar, uma vez que para mim sua função era somente essa, vestir e ponto.
Com o tempo, percebi que a coisa não é bem assim e que o vestir-se bem faz toda diferença, mesmo porque, querendo ou não, precisamos sustentar alguma aparência social e anda nos sentirmos confortáveis e bonitas. No que diz respeito a vestuário, isso é particularmente imprescindível para as mulheres e os homens sabem muito bem disso.

Com relação às botas de borracha, dispensava. Quando criança, lançava-me às poças descalça mesmo, pois adorava sentir a água sob meus pés. Era bom :)

Ivar C disse...

dexter, eu até de botas de couro jogava à bola. :)

jude, :)

sorriso de menina, lol! :)

perfectly crazy, fixe... eram multiusos... :)

anouska, ena! estavam vivas? :)

lily, cheguei a fugir dos senhores que as varriam, depois de fazer um monte delas voar. :)

olga, preocupação tinha com as reguadas da professora. :)

Ivar C disse...

giovana, ainda hoje comprei um casaco e escolhi-o entre muitos. escolher a roupa que mais se gosta é normal. fazer disso um culto é que não. :)

Olga disse...

Eu não tive uma besta dessas como professora. A minha era um doce. :)

Fatyly disse...

Subscrevo inteiramente e não consigo entender os desfiles de trapos em esqueletos ambulantes e desengonçados. Roupa e calçado, algo que odeio comprar e só o faço por extrema necessidade mas nunca por modas. Lá na minha terra não havia dessas botas e recordo-me que eu e o meu amigo Zé, tirávamos as sandálias e quer na ida, quer na volta era o campeonato de saltos em poças de água:):)

100€ por umas botas de borracha? tá louco!

Tens uma frase fabulosa: alguém que anula o sentido prático e divertido da vida para se colocar numa iluminada mas entristecida prateleira de loja, que é o que a palavra fashion nos faz a todos.

a mim não...mas vejo que muitos e muitas por vezes parecem montras horrorosas!

Gostei muito!

Ivar C disse...

olga, a minha dava reguadas mas também era um doce. eu já estou naquela fase da vida em que acho que era para nosso bem. :)

fatyly, boa. :)

Olga disse...

Ena...isso é mesmo um "estado zen". Por este andar daqui a pouco também vais achar que os cortes e aumentos e etc e tal são para nosso bem...;)

cheek disse...

As minhas eram amarelas....e ainda ontem vi umas numa montra e voltei à infância...e tive vontade de as comprar!Ainda bem que existem formas de voltarmos à infância, mesmo que seja através das "galochas", das camisolas com cotoveleiras, das saias com xadrez!
Hei-de comprar aquelas galochas amarelas e camuflar-me de criança!

Eli disse...

Olá!

Hoje vim dizer-te que o teu blogue está a "votos" na categoria de Humor nesta página que apresento a seguir (caso ainda não saibas):

http://aventar.eu/blogs-do-ano-2011/



Está muito bem posicionado!

:))

sal disse...

:) devem ser as hunter boots, um must have, dizem por aí... caríssimas e honestamente acho que de confortáveis devem ter muito pouco... enfim... não há nada como a bela da galocha de há uns anos... haviam umas que eram uns sapos lindos de morrer!!! :)

Ivar C disse...

olga, também não exageres. :)

cheek, só é preciso que te sirvam. :)

eli, obrigado. já me tinham dito, mas eu não me candidatei a nada... que giro. :)

sal, creio que já vi desses sapos. :)

Ana disse...

Também acho ridículo o preço das galochas hoje em dia! 150€ por um bocadinho de borracha?! Poupem-me!

Ivar C disse...

ana, é isso mesmo. :)

MissLilly disse...

Alguem que concorda comigo! As galoxas serviam para isso mesmo, para saltar nas pocas de agua (que saudades!, se agora fizer isso parece mal) ou para os agricultores que voltavam para casa com elas cheias de lama.
Galochas da moda?
E como um jeep, um jeep e para enfiar no meio do mato e subir montes e pocas de lama com toda a diversao incluida.

Ivar C disse...

liliana costa, é isso mesmo. :)