coisas que fascinam (157)
uma questão de pele
Talvez já tenha acontecido a todos nós. A mim, pelo menos, já me aconteceu mais do que uma vez não gostar duma pessoa não tendo motivo nenhum para tal. Lembro-me da Rosa, por exemplo, a quem nunca consegui apontar nenhuma característica que não me fosse simpática e de quem, no entanto, nunca gostei no seu todo. Nada mesmo, sublinhe-se.
Diz-se normalmente que é uma questão de pele, o que nos leva a não gostar duma pessoa contra a qual até nem temos nada. Que eu me lembre, nunca toquei na pele da Rosa, nunca a cheirei nem senti. Mas até acredito que possa ser mesmo uma questão de pele, já que nunca encontrei nenhuma justificação para tal.
A Rosa até era bonita. Tinha uma cabelo curto encaracolado e algumas sardas nas bochechas. Parecia uma menina de escola mal comportada e, se eu a tivesse visto apenas numa fotografia, acho que tinha gostado dela. Mas ela era apenas amiga duma amiga, ou seja, uma conhecida que nunca tinha passado desse estatuto, apesar de nos termos sentado um número infindável de vezes à mesma mesa do café.
Convém acrescentar, claro, que eu sempre tive a perfeita noção de que eu, para ela, também não era flor que se cheirasse.. As nossas conversas de café tinham sempre a Susana, a tal amiga comum, como intermediária.
Uma vez, tínhamos acabado de nos sentar os três à mesa do café e de pedir uma cervejas, quando a Susana recebeu um telefonema urgente qualquer e teve que se ausentar durante quase uma hora. Ficámos nós os dois, eu e a Rosa, duas peças dum puzzle que não encaixavam claramente uma na outra, frente a frente.
Lembro-me perfeitamente que me tentei refugiar na televisão mas estava a dar uma partida de ténis qualquer, desporto pelo qual nunca nutri grande simpatia e do qual sei muito pouco. Além disso, todos os jornais disponíveis no estabelecimento eram desportivos, coisa que eu também não consigo ler durante mais do que cinco minutos. Acabei por me refugiar na própria cerveja, que bebi mais depressa do que seria normal por não ter com quem falar.
O silêncio começou a ser perturbador e eu olhava ansioso para a entrada à espera que a Susana regressasse ou que, pelo menos, um outro amigo qualquer entrasse e desanuviasse o ambiente pesado. A Rosa, de cujo olhar o meu fugia como uma borboleta tonta, estava sentada como se fosse uma estátua intocável, o que me incomodava ainda mais.
Foi nesse momento que tudo mudou. Ela começou a rir, abriu a carteira e deu-me uma pequena consola de jogos para a mão, uma Game Boy Color. Eu fiquei perdido e perguntei-lhe para que é que eu queria aquilo.
- Nós, por qualquer motivo, não gostamos um do outro. Isso é ponto assente. Mas escusas de estar aí tão inquieto só porque não temos assunto. Eu posso estar aqui quieta e não te chateio com nada e tu, se quiseres, podes jogar com a consola do meu filho.
Posta esta coragem em cima da mesa, que me surpreendeu de forma positiva, abriu-se uma porta para eu lhe dizer o que estava a sentir.
- Desculpa lá. Não tenho mesmo nada contra ti. Apenas não me sinto muito bem contigo, nem sei bem porquê...
A Susana acabou por demorar bastante mais do que o previsto e, quando chegou, estávamos ainda nós em amena cavaqueira sobre a forma como as pessoas podem ou não gostar umas das outras. Nesse dia ficámos finalmente amigos e ainda hoje o somos. Pode haver, de facto, uma questão de pele, mas também há uma questão verbal, semântica ou de conversa de café (como lhe queiram chamar) que não é menos importante.
Talvez já tenha acontecido a todos nós. A mim, pelo menos, já me aconteceu mais do que uma vez não gostar duma pessoa não tendo motivo nenhum para tal. Lembro-me da Rosa, por exemplo, a quem nunca consegui apontar nenhuma característica que não me fosse simpática e de quem, no entanto, nunca gostei no seu todo. Nada mesmo, sublinhe-se.
Diz-se normalmente que é uma questão de pele, o que nos leva a não gostar duma pessoa contra a qual até nem temos nada. Que eu me lembre, nunca toquei na pele da Rosa, nunca a cheirei nem senti. Mas até acredito que possa ser mesmo uma questão de pele, já que nunca encontrei nenhuma justificação para tal.
A Rosa até era bonita. Tinha uma cabelo curto encaracolado e algumas sardas nas bochechas. Parecia uma menina de escola mal comportada e, se eu a tivesse visto apenas numa fotografia, acho que tinha gostado dela. Mas ela era apenas amiga duma amiga, ou seja, uma conhecida que nunca tinha passado desse estatuto, apesar de nos termos sentado um número infindável de vezes à mesma mesa do café.
Convém acrescentar, claro, que eu sempre tive a perfeita noção de que eu, para ela, também não era flor que se cheirasse.. As nossas conversas de café tinham sempre a Susana, a tal amiga comum, como intermediária.
Uma vez, tínhamos acabado de nos sentar os três à mesa do café e de pedir uma cervejas, quando a Susana recebeu um telefonema urgente qualquer e teve que se ausentar durante quase uma hora. Ficámos nós os dois, eu e a Rosa, duas peças dum puzzle que não encaixavam claramente uma na outra, frente a frente.
Lembro-me perfeitamente que me tentei refugiar na televisão mas estava a dar uma partida de ténis qualquer, desporto pelo qual nunca nutri grande simpatia e do qual sei muito pouco. Além disso, todos os jornais disponíveis no estabelecimento eram desportivos, coisa que eu também não consigo ler durante mais do que cinco minutos. Acabei por me refugiar na própria cerveja, que bebi mais depressa do que seria normal por não ter com quem falar.
O silêncio começou a ser perturbador e eu olhava ansioso para a entrada à espera que a Susana regressasse ou que, pelo menos, um outro amigo qualquer entrasse e desanuviasse o ambiente pesado. A Rosa, de cujo olhar o meu fugia como uma borboleta tonta, estava sentada como se fosse uma estátua intocável, o que me incomodava ainda mais.
Foi nesse momento que tudo mudou. Ela começou a rir, abriu a carteira e deu-me uma pequena consola de jogos para a mão, uma Game Boy Color. Eu fiquei perdido e perguntei-lhe para que é que eu queria aquilo.
- Nós, por qualquer motivo, não gostamos um do outro. Isso é ponto assente. Mas escusas de estar aí tão inquieto só porque não temos assunto. Eu posso estar aqui quieta e não te chateio com nada e tu, se quiseres, podes jogar com a consola do meu filho.
Posta esta coragem em cima da mesa, que me surpreendeu de forma positiva, abriu-se uma porta para eu lhe dizer o que estava a sentir.
- Desculpa lá. Não tenho mesmo nada contra ti. Apenas não me sinto muito bem contigo, nem sei bem porquê...
A Susana acabou por demorar bastante mais do que o previsto e, quando chegou, estávamos ainda nós em amena cavaqueira sobre a forma como as pessoas podem ou não gostar umas das outras. Nesse dia ficámos finalmente amigos e ainda hoje o somos. Pode haver, de facto, uma questão de pele, mas também há uma questão verbal, semântica ou de conversa de café (como lhe queiram chamar) que não é menos importante.
17 comentários:
Acho que isso acaba por acontecer com todos nós eventualmente :)
Y2000K, acaba mesmo... é uma questão estatística. :)
o primeiro passo.....é o clique!!
e foi de MULHER com M grande a Rosa ;)
mas sim...acontece..
a rosa é uma mulher frontal, o que para mim é bom, quanto ao resto tem a ver com a energia, com certas pessoas temos uma certa compatibilidade de energias e com outras é uma tristeza...
quase nos "entas", concordo. :)
o olhar do lobo, tristeza é a palavra adequada, literalmente, a este tipo de situações. :)
Por isso é que a expressão "a falar é que a gente se entende" está tão certa. Ainda não lhe tinhas dado sequer o beneficio da duvida e dirigido umas palavras à moça e imperava o desconforto vá-se lá saber porquê. Claro que as mulheres são praticas e com a nintendo quebrou o gelo!!
Gostei
Quando é mesmo uma "questão de pele" não há nintendo nem sequer psp que valha, acredita !
vadia, mas a questão não era racional... não tinha a ver com dúvida ou certeza. :)
"uma questão de pele" é uma expressão que se utiliza quando se "conhece" a pele através do toque, do cheiro, etc. e refere-se à atração positiva que se torna numa força de aproximação. O sentido que acabas de explicar não tem a ver com a expressão da pele. Mas, já me apercebi de que apesar de me dar bem com quase toda a gente, há algumas pessoas - poucas - com as quais não há qualquer ligação. E, ao pensar nisso, apercebi-me que as pessoas antipáticas para mim, repelem-me e exercem em mim uma vontade de distância! :)
Gostei da Rosa.
Teve um bom desfecho...mas às vezes não há mesmo nada a fazer :P
eli, mas... pessoas antipáticas repelem-nos sempre, não é? a antipatia até talvez seja, pelo menos às vezes, uma consequência também da rejeição. :)
redonda, lá está... eu não. :)
Ana Ricardo, com certeza que sim... eu nunca achei isso grave. :)
O mais curioso é quando conheces uma pessoa que é amiga de outra e só é antipática contigo... ou quase isso, mas um dia conto-te umas histórias! :)
adorei este post. fez-me sorrir.
isabel soufolhasolta.blogspot.com
eli, não me espanta, isso... não me espanta. acho que também já aconteceu a todos. :)
IsaMaria, obrigado. :)
Contam-se pelos dedos as pessoas com quem embirro e não gosto mesmo e ou vice-versa, que nunca me fizeram mal algum e algumas nem nunca me falaram o que é mais estranho.
Não vou por ser uma "questão de pele" diria antes "questão de empatia".
Uma questão de pele, a meu ver é cortar radicalmente com alguém que nos fez tanto mal e só de a ver...fica-se cheio de picos.
Mas em ambas as situações, devemos, pelo menos eu faço um trabalho/análise cerebral de maneira a ficarmos de bem connosco próprios...o tal papel da Rosa que gostei imenso!
Acho que na maior parte das vezes é inevitável fazermos juizos de valor ou simplesmente cultivarmos ideias pré concebidas em relação a seja quem for que acabamos de conhecer, sem dar realmente hipotese de, numa conversa por exemplo, se revelar. E acabar por nos surpreender :)
fatyly, isso revela algum equilíbrio emocional que nem todos têm, lá está. :)
she knows, isso é verdade, sim... é por isso que a idade ajuda a acabar com preconceitos. :)
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