3.26.2014

pensamentos catatónicos (303)

Um abraço

Há duas palavras que eu detesto: "empreendedorismo"  e "sucesso", porque actualmente as duas estão tão próximas uma da outra quanto distantes. Por isso, mas também porque detesto fingimentos e lonjuras. Ser empreendedor ou ser um self made man é ser a antítese do Amor. A merda deste país acabou nestas duas palavras. Fala-se do sucesso dum amigo porque ele tem emprego ou abriu uma lojeca qualquer numa esquina da cidade, nunca porque ele está apaixonado apesar dos seus quarenta anos. Não me fodam, a felicidade não passa por aí.
O Amor também não é felicidade, é verdade. O Amor é estar vivo, é estar sempre nos píncaros da felicidade ou da tristeza profunda. Nada mais. Mas é isso que é estar aqui, tão vivinho quanto a sardinha que salta no cais depois de apanhada. Este país cansa-me porque já nem sequer sabe estar triste. Não sabe sofrer. Só sabe falar em palavras vãs como empreendedorismo e sucesso. Fala-se nisso, depois morre-se.
Tenho uma má notícia para todos os que  consideram que o seu sucesso passa por ter um pequeno negócio ou por uma pequena empresa que lhes permite sobreviver: isso não vale uma merda. O que vale é, tendo uma loja, sorrir para os clientes, apaixonarmo-nos todos os dias, dar a mão a um Amor todas as manhãs. O resto é folclore. Até eu estou a abrir um negócio. Não para viver, mas sim para sobreviver.
Este país cansa-me porque já nem sequer é um país. É um pequeno grupo de gente que busca uma conta bancária confortável, apesar de nunca o conseguir, e acha que isso é normal. É um país que não fala de Amor, é uma coisa sem vida que nem triste consegue ser. Eu não quero ser parte disto, até porque ainda me apaixono todos os dias. 
Agradeço à mulher que hoje, no Parque Infante Dom Pedro, me pediu um abraço. Um abraço nunca se pede, porque quando se dá também se recebe. É isso, um abraço troca-se. É por isso que é tão bom abraçar. Só por isso. Tenho pena de quem ainda não chegou lá. Ela chegou lá hoje. Eu também.

12 comentários:

Sol de Dezembro disse...

Nem mais!
Um dia (uma vida) feliz!

Silk disse...

É isso mesmo.

Ivar C disse...

Anónimo Sol de Dezembro, obrigado. :)

silk, :)

Eli disse...

E eu vivo num mundinho de sobrevivências onde sorrir, falar alto, ser-se o eu de cada um tem que estar camuflado, tenho que estar quase sempre a quase pedir desculpa porque eu preciso da merda do trabalho, de passar os míseros recibos verdes e repetir-me. Gostar do que faço, apaixonar-me momentaneamente por um momento do meu dia soa quase como se fosse um acto ilegal. Quero mais também. Quero que não se finja todos os dias que não estamos com mais seres humanos no metro. Gostava que não tivéssemos que ter ua circunstância plausível para simplesmente falar com pessoas, com humanos. Só queria poder fazê-lo sem parecer louca e ser logo julgada. Há uma frase por aís que diz "se levantares os olhos do telemóvel, reza a história que vais encontrar pessoas e ver árvores...". A verdade é que Lisboa tornou-se grande demais para tanto que queria ser. Não devo culpar os outros, mas cansei-me de coisas dessas.

EJSantos disse...

Concordo.

"empreendedorismo" e "sucesso"

Que nojo de palavras, quando associadas a esta visão insana da sociedade, enquanto lugar de competição cega.

Olga disse...

É por isso que dizem que as melhores coisas da vida são grátis. E esqueço-me disso tantas vezes preocupada com as mesquinhices da vida, com o contar dos tostões para chegar até a fim do mês. Somos escravos do capitalismo e a liberdade só depende da nossa vontade.

Fatyly disse...

Excelente e subscrevo totalmente!

Recebe um abraço sincero!

Kelly disse...

Que coisa boa! Depois de muito tempo sem passar por aqui, pois estava tratando exclusivamente do meu novo amor, minha filha linda. Agora volto ao trabalho e já que ela não está por perto,aproveito para ler os seus textos. Fiquei morrendo de vontade de sair daqui correndo pra abraçar a minha pequeninha ;) nada vale mais do que isso.

Anónimo disse...

E a partir do dia 26 nada mais será cm antes, para ambos! ;)

Ivar C disse...

eli, já andei aí. :)

ejsantos, actualmente estão sempre, é esse o problema. :)

olga, pois somos... concordo tanto. :)

fatyly, um abraço também. :)

kelly, nada. boa sorte. :)

osolbrilhaaqui. :)

Helena disse...

Caro Ivar,está redondamente enganado! Eu tenho orgulho do meu empreendedorismo e do meu sucesso! Ser empreendedor também pode ser no amor, e é aí que eu ganho!!! Lutar pela pessoa que se ama, inventar e reinventar o presente para o mesmo ser possível, e chegar ao fim do dia com sucesso... fazem com que estas palavras me sejam caras! O resto? O resto são tretas. (Compreendi perfeitamente o que queria dizer, só puxei um bocado ao lado, porque também eu estou farto dessas palavras no contexto habitual)

Ivar C disse...

ernesto, :)