a mulher do táxi
Uma vez apaixonei-me por uma mulher num táxi. Como não lhe vi a face, do que me lembro é das luzes tristes dos candeeiros públicos da cidade e da estrada a passar por mim da mesma forma que todos os outros Amores da minha vida já tinham passado.
Quando abri a porta de trás para lhe perguntar se me podia levar até ao bairro de Darvenitsa, ela não virou a cara. Disse "da", que em búlgaro quer dizer sim, e fixou o olhar no vidro da frente como se a vida não tivesse mais opções do que seguir por aí, sempre em frente.
Ia a chorar e tinha olhos negros. Mais negros do que a noite, digo. E grandes. Vi-os no espelho retrovisor central durante dois ou três segundos. Por qualquer motivo que não sei explicar, percebi que ela chorava por Amor. Talvez tenha sido o choro, que é sempre diferente dos outros choros.
Todos sabem que chorar por Amor é fazer um pedido à vida, que uma situação se reverta. Depois, como nunca nada se reverte, deixa-se de chorar e olha-se em frente, o único caminho possível. As lágrimas são uma desilusão porque nunca fazem nada do que lhes pedimos, mas pelo menos servem para percebemos a direcção que devemos tomar.
No rádio do táxi passava uma música inglesa da qual me lembro que o primeiro verso era "In the morning I am a recluse lost in memories, ideal situations and convulsions" e o refrão apenas uma repetição da frase "We don't need nobody else".
Quando ela parou o táxi no bairro onde eu vivia, o contador marcava quase dez levs. Dei-lhe a nota por cima do ombro direito dela e as nossas mãos tocaram-se por um segundo. Depois ela amassou a nota como se odiasse dinheiro e a minha mão caiu-lhe nesse ombro como se fosse um floco de neve. Desejei-lhe boa sorte em pensamento, mas tenho a certeza que ela ouviu como se eu tivesse gritado.
Foi nesse momento que me apaixonei por ela. É impossível não me apaixonar por uma mulher capaz de ouvir o que eu penso.
O táxi dissolveu-se na noite enquanto eu atravessava a estrada. Nunca mais a vi.
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