4.26.2012

respostas a perguntas inexistentes (205)

nuvens

Adormeço durante cerca de quinze minutos. Quando acordo, olho pela janela e a paisagem já é outra. Não assisto à sua lenta transformação, em que a densidade de casas e árvores se vai desertificando. Em vez disso, esta viagem de comboio parece mais uma aventura numa máquina de teletransporte. Torno a fechar os olhos e tudo torna a acontecer.
No escuro do sono, meio adormecido, sou assaltado pela ideia confusa de que estou a reviver toda a minha vida, todos os meus Amores. Tenho a noção de que foi assim que vivi, teletransportando-me de uns para outros, fechando os olhos e adormecendo entre eles. Algumas vezes saí em estações, mas a maior parte delas foi apenas em apeadeiros. Acordo.
À minha frente, uma mulher que aparenta ter cerca de dez anos a mais do que eu, adormeceu e pousou a cabeça no ombro do homem que a acompanha. Reparei também que, para não a incomodar, ele ainda não se mexeu desde o princípio da viagem. Vai ali como se fosse uma estátua feliz, talvez com formigueiro no braço, a embalar quem Ama.
A minha atenção centra-se nele. Leva um livro aberto numa das pernas, numa página marcada pelo próprio joelho, que não se atreve a ler. Tudo o que ele quer é manter o máximo de silêncio e quietude, para não incomodar o bem estar da mulher. Outro comboio qualquer cruzou-se com o nosso, e imediatamente o vi a pousar a mão numa das orelhas dela para abafar o ruído. De resto, tem ido sempre a olhar pela janela. Ele sim, a ver a paisagem modificar-se lentamente.
Acho que somos todos mais ou menos assim. Às vezes apetece-nos adormecer e acordar noutro lugar qualquer. Um lugar que seja diferente e que nos dê uma nova oportunidade para Amar. Outra vezes queremos desfrutar de cada segundo, como se o tempo fosse essa paisagem mutante que vai passando por nós. Isso acontece quando estamos apaixonados. Mais nada o permite.
Fecho os olhos. Sei que dentro de pouco tempo vou apanhar um avião para Madrid, onde conto passar todo o fim de semana. A Raquel também vai e, com ela, espero ver todo o céu sem perder uma única nuvem. Até ao meu regresso e fiquem bem.

conversa 1901

Ela - Este fim de semana podíamos beber um copo.
Eu - Não estou cá. Vou passar o fim de semana a Madrid.
Ela - Detesto esta sensação de ver todos a ir para qualquer lado e eu a ficar aqui, nesta cidadezinha de merda, sozinha.
Eu - Não precisas ficar aqui. O Porto, por exemplo, é aqui tão perto...
Ela - Detesto ainda mais perceber que todos vão facilmente para qualquer lado e que eu, apesar de não querer ficar aqui, também não quero ir a lado nenhum.

4.24.2012

por uma vida melhor

Há muitos tipos de ditadura. Tantos, que às vezes se veste com o nosso dia-a-dia e é fácil perder a noção de que se vive sob uma. Todas as ditaduras têm duas coisas em comum. Primeira: o poder executivo confunde-se com o poder legislativo, isto é, quem faz as leis é também quem executa. Segunda: as ditaduras surgem sempre em nome dum valor qualquer que se supõe ser mais importante que todos os outros. É por isso que na política, no Amor, assim como em tudo na vida, é fácil cair em tentação ditadura.
Por exemplo, até ao dia 25 de Abril de 1974 vivemos, em Portugal, na ditadura dum pequeno-fascista. Uma ditadura da direita social, portanto. Matou-se, prendeu-se e torturou-se, tudo em nome de valores tão falaciosos como Deus, Pátria e uma família sem pensadores e sem vontades. Nem Deus, se existisse, nem nenhuma pátria ou família, dependeriam uma vez que fosse dum regime que pode, quer e manda.
Actualmente vivemos uma Ditadura diferente. A dos Mercados e do capitalismo selvagem. Uma ditadura da Direita Económica, portanto. Leva-se pessoas à fome, à miséria e ao desespero, tudo em nome duma suposta Democracia. As pessoas votam e pensam que controlam tudo. Só que não controlam nada. Zero. O voto está sempre viciado à partida, principalmente através duma Educação que não o é, e também do contexto mediático.
As ditaduras de Estado, neste aspecto, são muito parecidas com as ditaduras no Amor. Aquelas em que, por exemplo, nasce a violência doméstica. Agride-se e tortura-se uma pessoa durante anos a fio, tudo em nome do Amor. Uma mulher pensa que é Amada, mas de facto não o é. Zero. O Amor está viciado à partida por uma relação de posse, de propriedade da pessoa como se ela fosse uma coisa. E sim, eu sei que também pode acontecer com um homem.
O Amor não existe em nenhuma ditadura. Nem o Amor, nem mais nada. Todos os dias luto, com as limitações que tenho, para que se faça um 25 de Abril nesta nova ditadura em que vivemos, ou melhor, em que sofremos.  São os recibos verdes, é a falta de acessibilidade à saúde, à educação, à mobilidade e aos recursos naturais. É a fome e o desemprego propositado. Olho para este país e só vejo ditadura e o consentimento de quem é agredido todos os dias.
Pode haver quem não perceba isso, mas o 25 de Abril que eu quero ver neste país é o mesmo 25 de Abril que eu vejo no meu Amor. É justo, sem violência e sem propriedade privada. É igual em ambos os sentidos. É Amor. Por uma vida melhor.

4.23.2012

orangotangos

Enquanto género, o homem é um ser desprezível. Torna-se ainda mais desprezível quando comparado com a mulher. É uma verdade que tenho como certa, ou uma certeza que tenho como verdade. Tanto faz. Pensei nisto hoje de manhã, quando entrei no metro do Porto, mas a verdade é que é um pensamento que se está a tornar repetitivo. Todos os dias, por um motivo qualquer, sou assaltado por ele. E todos os dias, meus amigos, é a estatística a dar-nos certezas.
Voltemos ao metro do Porto hoje de manhã. Entro na estação das Sete Bicas em direcção a Campanhã, uma estação depois entra uma das mulheres mais bonitas que já vi na minha vida. Sem exageros. Olho para ela e agradeço-lhe, em pensamento, o facto de ter tornado esta ordinária viagem de metro numa coisa extraordinária. Os olhos dela cruzam-se com os meus e eu desvio-me. Atrás de mim ouço um grupo de rapazes em risadas histéricas que são, obviamente, por causa dela. É uma atitude animalesca, de quem se manifesta fisicamente por ser incapaz de qualquer reacção intelectual à presença duma mulher bonita. Quando ela se levanta para sair, na Trindade, eles grunhem uma última vez. Depois calam-se. Um homem mais velho, embalado por aquela performance dantesca, grita-lhe qualquer coisa como: "Gandas marmelos!". É a primeira vez que tenho vergonha do meu género neste dia. Não será a última.
Chego ao meu local de trabalho e abro o meu email. Um amigo enviou-me um link para uma reportagem sobre abusos sexuais a orangotangos fêmeas na Indonésia. Os animais, uns, são capturados, acorrentados a camas e preparados para a prostituição. Outros, sempre homens, pagam esse abuso sexual. Por um momento faz-se luz. Há qualquer coisa em comum nesta notícia e naquilo a que assisti no metro. É a ausência total de emoção e de razão. E isto, meus amigos, só acontece em homens.
No género masculino, há um número significativo de indivíduos cuja vida é totalmente aniquilada por uma hormona. Quando digo vida, digo também capacidade de Amar. É por isso que  são sempre homens, os autores das notícias mais escabrosas sobre abusos sexuais. Ponto. As mulheres são diferentes. São melhores, e estranhamente mantêm a capacidade e paciência para viver no meio dos homens. Não as compreendo. Admiro-as.

conversa 1900

Ela - O teu blogue era muito mais interessante quando não tinhas namorada.
Eu - Eu gosto mais agora.
Ela - Agora, quando te pões com sentimentalismos, és um chato. Espero que a Raquel te deixe o mais depressa possível.

4.20.2012

conversa 1899

Eu - Achei muito estranho tu ontem nem sequer teres falado com a Guida.
Ela - Eu nunca mais falo com a Guida.
Eu - Estão zangadas?
Ela - Estamos. Ela disse-me uma coisa daquelas que ferem mesmo, só para me magoar.
Eu - A sério?! O que é que raio ela te pode ter dito assim tão grave?
Ela - Agora já não me lembro bem, mas sei que disse.

4.19.2012

conversa 1898

(ao telefone)

Ela - Não me devias ter telefonado agora.
Eu - Porquê?
Ela - Estou a fazer uma coisa que ninguém pode fazer por mim.
Eu - Estás na casa de banho?
Ela - Não. Estou a dizer mal das amigas todas do meu marido.
Eu - A quem?
Ela - Ao meu marido, claro. Nunca diria mal das amigas dele a mais ninguém. Não tenho mau carácter.
Eu - Estás mesmo?
Ela - Só de algumas, pronto.
Eu - E dizes mal de mim?
Ela - Tu és meu amigo. Ele é que me diz mal de ti, de vez em quando.
Eu - Quando é que te posso ligar, então?
Ela - Daqui a uma horinha, pode ser?
Eu - Uma hora?!
Ela - Sim. Sempre que nos pomos a dizer mal dos amigos do outro, precisamos de pelo menos uma hora.
Eu - E fazem isso regularmente?
Ela - De vez em quando. É uma forma de fortalecer a relação.
Eu - E o teu marido está aí a ouvir a nossa conversa?
Ela - Sim, e já está a dizer que és um chato.

4.18.2012

manual de instruções para zangas banais

Sei que há dois tipos de zangas entre pessoas que partilham a vida. Há zangas banais, daquelas que surgem de pequenos nadas do quotidiano, e que se resolvem sozinhas. Há zangas mais a sério, daquelas em que um acaba a tentar ofender o outro sem perceber muito bem porquê. Sempre pensei que as zangas banais acontecem entre pessoas que se Amam. Talvez até sejam necessárias, sei lá. Por outro lado, as zangas mais a sério acontecem entre pessoas que já se Amaram. 
São dez da manhã dum dia qualquer e o dia está como eu: cinzento. Não está chuva nem Sol, não está frio nem calor. Caminho de meias pela minha própria casa, à deriva, sem saber muito bem em que divisão devo parar. Ela acabou de sair, há cerca de dez minutos atrás e, para além duma taça de cereais suja em cima da banca da cozinha, não deixou mais nada. Nem um sorriso, nem um beijo, nem sequer um "até logo". O último som que ouvi na minha vida foi o da porta a bater, e tenho a sensação que foi há mais tempo do que esses dez minutos. Depois fez-se silêncio.
É nesse silêncio que tento perceber que tipo de zanga é a nossa. Não consigo. Sei que ontem tentei fazer Amor com ela quando nos deitámos e ela, que já tinha vestido a camisa de dormir, apagou a luz do pequeno candeeiro da mesa de cabeceira e disse-me que estava cansada. Não liguei. Adormeci também. Hoje de manhã disse-me que, apesar dos nossos dez anos juntos, parece que ainda não a conheço. Depois saiu. Sento-me no sofá da sala e faço uma lista daquilo que sei dela e que, dentro do que é humanamente possível, tento cumprir.

Lista das coisas que sei sobre a Teresa:

- gosta que eu ponha os copos maiores na parte de trás do armários da cozinha e os mais pequenos à frente.
- gosta que eu veja os jogos de futebol na televisão com o som desligado.
- gosta de ser ela a temperar as saladas, mesmo que seja eu a fazê-las, e não podem ter milho.
 - gosta que eu tire as palmilhas dos sapatos e deixe tudo, antes de me deitar, na janela da cozinha.
 - gosta de beber um chá de hortelã à noite, enquanto eu bebo um café expresso sem açúcar.
 - gosta que eu ponha os catálogos do IKEA e a Dica da Semana junto à sanita, para ela ler quando vai à casa de banho
 - detesta que o saco de lixo orgânico comece a deitar cheiro.
 - gosta de ser ela a escolher as peças de roupa que vão à máquina de lavar, por causa do tipo de tecido e das cores.
 - gosta que as garrafas de vinho fiquem na despensa e que, caso alguma já esteja aberta, fique dentro dum armário. 

São tudo coisas pelas quais já tivemos zangas banais. Uma vez, por exemplo, partiu um copo grande ao pegar num dos pequenos, que eu tinha guardado mais ao fundo, e ficou quase a noite toda sem me falar. Depois, antes de nos deitarmos, resmungou que a casa precisava de mais organização. Nessa noite também não fizemos Amor. Nunca fazemos quanto temos esse tipo de zangas. Tanto quanto me lembro adormeci já depois das quatro da manhã, a pensar se aquela palavra - organização - seria um pedido ou uma espécie de ordem nazi. Deviam ser umas três quando me levantei e fui um bocado até à sala, beber um copo de leite morno e deitar-me no sofá a ver as miúdas avantajadas dos programas nocturnos da televisão. Ela levantou-se e veio-me buscar assim que deu pela minha falta na cama. Ainda dá pela minha falta, pensei.
Devo ter adormecido neste mesmo sofá. Pelo menos é ela quem me acorda agora, depois de ter lido o papel com a lista que estava ligeiramente amarrotado entre os meus dedos. Nem sequer a ouvi entrar. 

- Podes acrescentar aí uma coisa. - diz.
- Qual? - bocejo.
- Gosta que lhe perguntem como está, de vez em quando, principalmente nos dias em que anda doente.
- Como estás?
- Com vontade de te bater - beija-me.

4.17.2012

uma boa e uma má notícia

Acho que o fiz para passar a gostar, o mais depressa possível, de estar sozinho. Quando me separei, e em esforço, ganhei imediatamente um hábito novo. Cozinhar, ao jantar, sempre uma receita nova e que ultrapassasse em muito o facilitismo dos enlatados e das refeições pré-feitas dos supermercados. Utilizava quase sempre uma toalha lavada, uma banda sonora diferente e uma garrafa de vinho um pouco mais cara do que até então. 
Depois de jantar, e já com a louça lavada e um uísque bebido, saía de casa e caminhava sempre em direcção ao mesmo bar onde, se fosse possível, ocupava o mesmo lugar ao balcão e bebia todas as noites também o mesmo. Um café Delta e dois ou três uísques Bushmills. Às vezes aparecia um conhecido qualquer e acaba a conversar sobre uma trivialidade qualquer, outras vezes não aparecia ninguém e trocava apenas algumas ideias com o empregado.
Esta rotina teve em mim o óptimo efeito de fazer com que as minhas noites deixassem de ser más. Numa dessas noites, em que ninguém apareceu para conversar e o empregado andava demasiado ocupado para me aturar, apercebi-me que todavia nenhuma era muito boa. Eram, todas elas, noites mais ou menos.
Lembro-me perfeitamente do dia seguinte. Cozinhei uma quantidade generosa de Ameijoas à Bolhão Pato que comi com bastante pão de mistura, acompanhado por uma toalha nova amarela comprada numa promoção qualquer, e uma garrafa de Quinta da Bica que tinha escolhido por ser da região do Dão. Tudo ao som da Cesária Évora. Lavei a louça, bebi um uísque e saí de casa. Foi logo no primeiro cruzamento que decidi virar, pela primeira vez nessa fase da minha vida, à direita e seguir caminhando sem destino óbvio. Não sabia se ia ter uma noite boa ou má, mas o principal objectivo era que não fosse mais ou menos.
Já nos subúrbios da cidade, dissimulado pela fraca luz de alguns candeeiros público intermitentes, percebi que alguém empurrava um carro rouco e fui ajudar. O automóvel acabou por pegar, depois do motor soluçar duas ou três vezes, e o condutor desapareceu engolido pela noite enquanto agradecia com um braço fora da janela. Fiquei eu, ela e um vento fraco, sozinhos numa rua deserta. Nenhum reagiu prontamente àquele encontro inesperado, nem para se despedir, nem para se apresentar. Passou a ser óbvio que nenhum de nós tinha para onde ir e não queria ser o primeiro a admiti-lo.

- Ando à procura dum sítio para beber qualquer coisa. Há aqui algum bar perto? - perguntei.

Só a vi bem quando entrámos num café vazio, onde o dono via os resumos dos jogos de futebol e demorou uma meia hora para nos vir perguntar o que queríamos. Era, à vontade, uns vinte e tal anos mais velha do que eu, cujo semblante triste se deixava rasgar de vez em quando por sorrisos contidos. Contou-me que em nova tinha sido actriz de teatro e que, antes do 25 de Abril, tinha mostrado as mamas em palco. Não percebi se o dizia com vergonha ou com orgulho, mas percebi que tinha pagado um preço muito alto por tal atrevimento. A família tinha-a expulsado de casa deixando-a, ainda nova, entregue a si mesma. 
Comparado com a vida dela, o meu divórcio recente ganhava uma dimensão bastante reduzida e tentei não me mostrar muito triste quando lhe expliquei porque é que andava ali perdido. 

- Separei-me há pouco tempo. - expliquei-lhe - Ando a tentar ganhar novas rotinas de vida e hoje, não sei porquê, vim aqui parar.
- Tenho uma má e uma boa notícia para ti. - sorriu ela mais tempo do que em qualquer sorriso anterior.
- Diz...
- A má notícia é que te divorciaste e nunca mais vais poder viver a vida como fazias até agora. Não é possível porque a tua principal companheira já não está contigo.
- E a boa notícia, qual é?
- A boa é que estás divorciado, por isso podes viver as coisas como te apetecer.

Por um momento percebi as minhas receitas novas todos os dias, as minhas toalhas lavadas de novo, as minhas garrafas de vinho escolhidas a dedo e as minhas idas sempre ao mesmo bar para beber uísque. Percebi até porque é que tinha mudado de direcção e ido para um café rasca falar com uma mulher que nunca tinha visto antes. Nessa noite mudei.

4.16.2012

conversa 1897

Ela - Finalmente sinto-me preparada para viver um Amor eterno...
Eu - Mas... tens quarenta e cinco anos. Nunca te tinhas sentido preparada antes?
Ela - Estou a falar desde ontem à noite. Ontem acabei com o meu namorado...
Eu - Nem sabia que tinhas namorado...
Ela - Não te cheguei a dizer porque não deu tempo. Só namorámos três dias.

4.13.2012

respostas a perguntas inexistentes (204)

o primeiro beijo da morte
No prédio onde eu cresci eram raras, para não dizer inexistentes, as conversas entre vizinhos. Todos se cumprimentavam sempre que se cruzavam, mas não mais do que isso. Foi por isso que estranhei quando, no fim duma manhã qualquer de Primavera, ouvi um burburinho intenso nas escadas cortado ao meio por dois ou três gritos ameaçadores. Era um homem forte, cuja face zangada parecia esculpida com uma faca do mato, que queria bater no vizinho do quarto direito.
Algumas pessoas tentavam acalmá-lo, segurando-o de frente como se pegassem um touro enraivecido. Aquilo que, no entanto, não conseguiam estancar, eram os gritos que tentavam justificar aquela violência toda. Ele tinha visto a mulher beijar o meu vizinho e queria matá-lo.
Acho que foi essa a primeira vez em que me apercebi da importância que um beijo pode ter. Tanta que pode culminar em morte, pensei.

o beijo da Bonnie Parker
Devo ter visto pela primeira vez o filme "Bonnie and Clyde", de 1967, aí com uns dez anos de idade, ou seja, uns quatro anos após a cena no meu prédio. Era um filme proibido para crianças mas que, por algum milagre que nunca consegui explicar, o meu pai me deixou ver.  Ainda bem. Foi com ele que confirmei que um beijo pode acabar em morte, e foi com ele que aprendi que os maus também se Amam.
Os maus, neste caso, são os próprios Bonnie e Clyde, um casal apaixonado de assaltantes de bancos. A Bonnie Parker e o Clyde Barrow não tinham uma vida normal nem decente como todos os outros, muito menos aos meus olhos de criança, mas o filme retrata-os como um casal mais feliz do que qualquer outro. No fim o meu pai, quando se apercebeu que eu não saía do sofá durante a ficha técnica, disse-me que aquela história era verdadeira.
Nesse dia confirmei a importância do beijo e de como ele pode acabar em morte.

o meu beijo
Esperei anos pelo meu primeiro beijo, que todos dizem que é o mais importante duma vida. Num certo sentido até é. Foi com ele que aprendi que os beijos têm sabores e foi com ele que aprendi que o beijo mais importante é sempre o último. Teve, pelo menos, essa importância que ninguém lhe tira.
Fazíamos, eu e a Márcia, concursos para ver quem conseguia que uma pedra ricocheteasse mais vezes nas ondas do mar. Ela ganhava sempre, porque a mim me faltavam as forças que gastava na confusão de um não Amor de Verão. Ela sorria e era enérgica, eu parecia sempre um pouco apagado. É isso um não Amor, e garanto-vos que é bem mais difícil do que um Amor qualquer,
Um não Amor é uma vontade de Amar que não cabe em ninguém, e que por isso acaba por se adaptar a quem está mais perto. É próprio da adolescência, é próprio de quem ainda não aprendeu a Amar. É vão, e a Márcia parecia sabê-lo. Uma vez disse-me que tinha atirado uma pedra que queria recuperar, mas que não era capaz de ir sozinha até à rebentação das ondas. Deu-me a mão e levou-me com ela, beijou-me e fugiu a sorrir. O beijo soube-me a sal, logicamente.
Nesse dia aprendi que um beijo pode acabar em vida.

dos beijos todos
Não acredito no Amor cujo primeiro toque não seja o dos lábios, logo a seguir ao ainda mais suave contacto das palavras. O beijo é o corpo a soltar-se para tudo o resto: a pele com a pele, os olhos com os olhos, o verbo com o verbo. E por falar em verbo, o beijo é também a assinatura do tratado que nasce cada vez que se diz "eu Amo-te!". Sem ele, o verbo Amar é apenas uma declaração vazia de intenção. No Amor vale muito pouco falar, mas vale tudo beijar. É no beijo que acreditamos sempre. Ou não. Podemos duvidar de nós mesmos quando dizemos "Amo-te!", mas nunca duvidamos quando beijamos "Amo-te!".

4.11.2012

...da deterioração do Amor

Tenho um amigo que é obcecado por números. Quando digo que ele é obcecado por números, digo-o sem qualquer tipo de reserva. Tudo aquilo que ele sente, vê, ouve ou diz tem que estar relacionado com uma lógica numérica qualquer. Por exemplo, sempre que anda de autocarro anota num caderninho a matrícula do mesmo e o número do lugar em que se senta. De vez em quando faz as contas e passa a saber exactamente quantas vezes andou em cada veículo e em que lugar. Diz ele que o faz para ter uma noção mais real do que está a ser esta sua passagem pela vida.
Por princípio, poderia ser considerado um amigo nerd e insuportável, mas não é. É alguém que eu adoro visitar de vez em quando para ter daquelas conversas, sempre regadas com algum uísque, que se estendem pela noite dentro. Também gosto de o receber, e se me conseguir esquecer que ele sabe exactamente quantos degraus precisa de subir para chegar a minha casa, conseguimos ter conversas normais.
Noutro dia fui eu visitá-lo, e depois dele me dizer quantas vezes em média eu limpo os sapatos no tapete da entrada, sentámo-nos e ele serviu-me o primeiro de seis copos de uísque Bushmills (segundo ele, é essa a média de uísques que bebemos por cada noite destas). A partir daí, ficámos na conversa até às cinco da manhã e, suponho eu, ultrapassámos em muito a média do álcool ingerido. Todas as nossas conversas são, pelo menos a meu ver, interessantes precisamente por isso. Eu falo das coisas numa perspectiva sempre mais solta, ele sempre preso à sua lógica sequencial ou estatística.
A ele, durante estes mais de dez anos em que nos tornámos amigos, só lhe conheci uma namorada. Ele gostava tanto dela que passou a comprar cadernos de capa dura para registar tudo o que considerava importante, penso eu que para que esses registos durassem mais. Um dia a namorada nunca mais apareceu e ele nunca me explicou porquê. Abanava os ombros cada vez que eu lhe perguntava e rapidamente mudava de assunto.
Dei o primeiro gole e ele perguntou-me porque é que eu estava triste. Abanei os ombros e disse-lhe que a minha namorada me tinha dito que precisava de algum tempo para pensar na nossa relação e que, acabada de chegar de férias, nem sequer ainda me tinha vindo ver. Disse-lhe que o mais horrível de tudo era esta urgência que eu tinha de estar com ela e que ela, nitidamente, não tinha de estar comigo. Olhei-o de frente e ele sorriu, como se me percebesse e finalmente, com esse olhar, me estivesse a explicar o que lhe tinha acontecido a ele.
Vi-o levantar-se e voltar com um desse caderninhos de capa dura dos tempos em que tinha namorada. Na capa, com uma esferográfica azul, tinha escrito "...da deterioração do Amor". Abriu-o com muita calma e explicou-me que entre o princípio e o fim da sua relação, o número de beijos que a namorada lhe dava por sua iniciativa desceu de vinte e dois por dia para apenas três, o número de vezes que ela lhe dava a mão na rua desceu de cem por cento para apenas dois por cento. Olhou-me nos olhos para tentar perceber a minha reacção, mas eu ouvia-o impávido e sereno, sem esboçar fosse o que fosse. Por fim, disse ele, o número de vezes que tinham sexo desceu de seis vezes por semana para uma vez de duas em duas semanas.
Bebi tudo o que restava no meu copo de uísque e eu próprio me servi de outro, sem o servir a ele porque ainda tinha o copo cheio. Perguntei-lhe se tinha sido ele a acabar com ele ou se tinha sido ela, só para ver se ele, finalmente, abria um pouco o véu que cobria o fim da sua relação. Abanou os ombros e respondeu-me que, desde então, abana os ombros cerca de três vezes por dia, ou seja, sempre que alguém lhe fala de Amor.

4.06.2012

foi só isso...

Por definição não gosto de galerias de arte. Gosto de arte, todo o tipo de arte, quando de alguma forma ela me emociona. O problema das galerias de arte é exactamente esse: castram a emoção pela raiz. Primeiro enclausuram-na, depois silenciam-na e por fim exibem-na como se fosse uma coisa rara. Não é. A arte, todo o tipo de arte, é-nos natural.
Ainda não estava apaixonado pela Teresa no dia em que fomos ver uma exposição de pintura em Lisboa, dum pintor qualquer de que já nem lembro o nome, mas acreditava que isso me ia acontecer em breve. Ela foi pousando brandamente os olhos dela, de quadro em quadro,  e quando andava era como se o som dos seus saltos altos fosse uma espécie de crime. Aligeirou o passo e perguntou-me se eu estava a gostar.

- Mais ou menos... - respondi para não a desiludir totalmente - nenhum dos quadros é figurativo, então nenhum  me diz nada.
- Ao menos fala baixo. - pediu ela de forma embaraçada.

Eu saí da galeria e esperei por ela lá fora e, enquanto passeava os meus olhos de forma discreta pelas mulheres que iam passando, decidi-me a não me apaixonar por ela. Às vezes, não Amar pode ser a melhor solução. Pelo menos foi o que eu pensei. A Teresa era bonita, mas também ela era uma espécie de galeria de arte. Nela, às vezes tinha que falar baixinho para não parecer estúpido. Outras vezes vezes era mesmo melhor calar-me.
Nesse mesmo dia inventei uma desculpa qualquer e apanhei o intercidades para Aveiro, onde acabei a noite sozinho a beber Bushmills num bar que também tinha nas paredes uma exposição de pintura. Sem sair da minha cadeira ao balcão, vi os quadros todos. Eram retratos de pessoas que provavelmente nem existiam. A dona do tasco reparou e perguntou-me se eu tinha gostado.

- Sim, todas as pessoas retratadas me parecem serenamente felizes, como se tivessem acabado de passar por uma qualquer contrariedade na vida e agora se sintam calmas e aliviadas.
- Obrigado, vou dizer isso à minha filha. - Ofereceu-me o terceiro copo de uísque, que agradeci.

Nessa noite cheguei à conclusão de que, pelo menos para mim, era melhor que todas as exposições de qualquer tipo de arte fossem em bares e não em galerias. Nas galerias, por norma, não interpretamos sequer o que vemos. Pelo contrário, submetemo-nos totalmente àquilo que é suposto perceber, ou então é melhor fecharmo-nos na nossa esmagadora ignorância.
Eu acredito, e gosto de acreditar, que o ser humano é criativo em praticamente tudo o que faz. A Amar também. O Amor é uma arte como outra qualquer, embora não tenha suporte físico. É como a música, por exemplo, e nesse dia desafinei de propósito para acabar de tocar uma canção que nunca me iria sair bem. Foi só isso.

4.05.2012

Assim vai ser difícil casar

Há mulheres encantadoras, tão encantadoras que não devia ser permitido que homens banais se sentassem ao lado delas nos transportes públicos. Há homens banais, tão banais que não devia ser permitido que se sentassem ao lado de mulheres.
O homem banal sentou-se mesmo à minha frente, no comboio, com cara de poucos amigos, e começou a praguejar por causa dum idoso qualquer que tinha demorado muito a comprar o bilhete na máquina automática. A mulher encantadora continuou a ler umas fotocópias que, suponho eu, teriam a ver com a sua actividade profissional ou académica. Eu continuei a ler o meu livro do Murakami. Acho que tanto eu como ela só queríamos silêncio, mas não o tínhamos.
Foi ela quem decidiu falar primeiro, e disse-lhe aquilo que é óbvio. Que as novas máquinas automáticas da CP podem ser complicadas para algumas gerações pouco habituadas às novas tecnologias, que o dever dele era ter ajudado primeiro e protestado depois. Evitei entrar na discussão, porque logo à partida percebi que não valia a pena, e foi isso mesmo que me encantou nela: insistiu. As mulheres encantadoras nunca desistem facilmente dum homem banal. É um dos seus encantos. Foram precisos, aliás, dez minutos para ela perceber aquilo que eu já tinha percebido. "Assim vai ser difícil casar", disse-lhe ele. 
Os homens banais acham que uma mulher que argumenta não é boa para casar, por isso mesmo. A banalidade não consegue ser dialéctica. Não evolui. Um homem banal hoje é igual a um homem banal medieval. Nasceu, vive a protestar porque os idosos o fazem perder tempo, e depois morre. É isso que é ser banal. Ela encantou-me porque ainda luta contra essa banalidade. Eu não consigo. Sou banal.

conversa 1896

Ela - Imagina que engatavas hoje uma mulher qualquer.
Eu - Estou a imaginar.
Ela - Acabavas num hotel com ela...
Eu - Sim...
Ela - O que é que ias pensar se, quando ela se despisse, reparasses que ela tinha umas cuecas até acima do umbigo, daquelas que servem para ficarmos mais magras na barriga? Uma cinta...
Eu - Argh!
Ela - Obrigado, era o que eu queria saber. Vou à loja devolver as minhas.

4.04.2012

respostas a perguntas inexistentes (203)

das coisas que eu não percebo em mim

Merda de microondas. Acabei de queimar a língua. Todas as manhãs é a mesma coisa: ou aqueço demasiadamente o leite ou tenho que o beber frio. Dantes, quando o punha num fervedor de metal e o aquecia no fogão a gás, nunca falhava. Sabia exactamente qual a temperatura a que estava só de olhar para ele. Agora, com o microondas, é todas as manhãs um stress. O que eu não percebo em mim, é porque é que tendo o fogão a gás mesmo ao lado do microondas, insisto em usar este último todas as manhãs.
Há mais coisas que eu não percebo em mim. Todas as manhãs, todos os dias, todos os meses, todos os anos. Por exemplo, saber que a Primavera gosta de entrar pelas janelas da minha casa e, mesmo assim, nunca as abrir mal a vejo do outro lado dos vidros. Vejo-lhe a luz, não lhe sinto cheiro.
Movimento-me assim, num colete de hábitos que tem como único objectivo fazer com que o tempo passe por mim sem que eu passe por ele, até ao segundo exacto em que me dou conta disso mesmo. Por exemplo, de que a pessoa que eu Amo e que está ali ao meu lado, não é apenas uma sombra de todos os dias, de quem me vou despedindo todas as manhãs para depois cumprimentar à noite com um beijo na boca sem sabor.
São dez horas e dezasseis minutos dum dia qualquer primaveril. Raspo três vezes um fósforo na respectiva caixa para acender um dos bicos do fogão. Faz-se fogo, faz-se luz. Aqueço o leite enquanto abro as janelas de casa e corro para a porta para beijar de novo a minha companheira. Mais prolongadamente, desta vez, e com um "Amo-te!" à mistura. A minha vida é uma das coisas que eu não percebo em mim.

4.03.2012

conversa 1895

Ela - Gostava que te tivesses apaixonado por mim, pelo menos uma vez na vida.
Eu - Para quê? Já falámos sobre isso...
Ela - Pois já.
Eu - Somos bons amigos, acho eu, e se tu nunca te apaixonaste por mim, não percebo porque é que raio quererias que eu me apaixonasse por ti.
Ela - Para te fazer sofrer um bocadinho. Só isso.
Eu - Para me fazer sofrer?!
Ela - Sim, tenho esta sensação estúpida de que nunca ninguém sofreu por mim.
Eu - Estás bem?
Ela - Sempre que um homem se apaixonou por mim, eu apaixonei-me por ele. Sou uma fácil...
Eu - Não sabes se algum homem sofreu por ti em silêncio...
Ela - Pois não, mas queria tanto saber.

4.02.2012

conversa 1894

(no café)

Ela - Está ali um passarinho pequenino.
Eu - Onde?
Ela - Ali, junto àquela árvore, do lado de lá do vidro.
Eu - É um pardal. Os pardais são pequeninos.
Ela - Mas aquele é pequenino mesmo e deve andar à procura da mãe. Devíamos ajudá-lo.
Eu - Eu não sei quem é a mãe dele, por isso não o posso ajudar.
Ela - Que falta de...
Eu - Falta de quê?!
Ela - De sensibilidade, de disponibilidade. De tudo.
Eu - Queres que eu interrompa a leitura do jornal para ir procurar a mãe dum pardal?!
Ela - Pelo menos podíamos pegar-lhe, porque parece que ele nem sequer consegue voar.
Eu - Não és tu que adoras gatos?! Daqui a pouco, se ele não consegue voar, serve de lanche a um gato qualquer. É bem empregue.
Ela - Às vezes consegues ser mesmo horrível.
Eu - Mesmo horrível?! Só porque estou a ler o Público e não me apetece sair daqui para ir apanhar um pássaro ao qual nem saberia bem o que fazer?
Ela - Sim.
Eu - Pronto, está bem. Sou horrível. 

respostas a perguntas inexistentes (202)

mergulho no mar

Eu costumava passar as tardes na esplanada a beber cervejas e a tentar pôr em dia a leitura. Era essa, aliás, a maior vantagem das férias. De vez em quando ela perguntava-me qual era a história do livro que eu estava a ler, mas eu nunca lhe conseguia responder. Nunca li um livro por causa da história em si, embora ela também me interesse, mas sim por causa daquilo que é indizível  e que só quem está a ler é que consegue perceber.
Expliquei-lhe isto, numa das vezes em que fechei as páginas para poder saborear melhor a cerveja, e ela pediu-me para lhe explicar ainda melhor. Não tinha percebido. Para ela, o mais importante de qualquer livro era sempre a história, aquela que se pode resumir depois num vigésimo da duração do tempo que demorou a ser lida. Para mim, o mais importante é sempre saborear cada momento de cada personagem de cada romance. Perceber as suas reacções ao que vai acontecendo e ver ali aquilo que porventura também há em mim. Ou não, claro. 
Continuou sem perceber e riu-se. Um riso que, em abono da verdade, me desiludiu. Bebi duma vez toda a cerveja que ainda estava no copo, guardei o livro no saco onde ainda estava a toalha de praia, tão seca e limpa como no princípio das férias, e encostei-me para a frente com os cotovelos em cima da mesa, de forma a aproximar-me o mais possível. Reparei que a pele dela já era um moreno tapete de sal e de Sol, e que ela estava ainda mais bonita do que quando eu a conhecera, um mês antes, e me apaixonara perdidamente. Expliquei-lhe melhor.

- Se continuarmos os dois assim, a história das nossas férias será que eu as passei todas nesta esplanada a beber cerveja e a ler, enquanto tu as passaste a tomar banho na água gelada e agitada do mar, a apanhar Sol sozinha na areia e, de vez em quando, a vir aqui beber uma cerveja comigo nos momentos em que eu interrompia a leitura para desfrutar da tua presença. Essa história, a mim, não me interessa nada.
- Não?! - perguntou ela finalmente interessada no que eu lhe dizia.
- Não. A mim o que me interessará é que, à medida que ia bebendo, ia ficando também mais interessado nos livros que lia, e mais feliz, mas que essa felicidade nunca foi maior do aquela que sentia nos breves momentos em que vinhas fazer-me companhia. Mais ainda, interessa-me também que cada vez que te sentia ir embora, ficava com uma profunda sensação de tristeza apenas pela efémera distância física que crescia entre nós.

Ela não se riu. Só sorriu. Deu-me a mão esquerda, agarrou no meu saco com a direita e puxou-me para a areia.

- Também sinto essa tristeza momentânea, por isso agora vens comigo para a praia. É justo?

Era justo. Foi nesse fim de tarde que dei o meu primeiro mergulho no mar e acho nunca nenhum me soube tão bem.